Ago
01
2016

Docentes e estudantes criticam fim do Ciência Sem Fronteiras para graduandos

Decisão do ministério é parte da política de cortes orçamentários da Educação, afirmam

DA REDAÇÃO DA ADUFF
Por Aline Pereira
Foto: Ministro da Educação, Mendonça Filho. Crédito: Antonio Cruz/Agência Brasil

“Programas de internacionalização são  fundamentais para a troca de experiências entre estudantes e contribuem fortemente tanto para a melhor formação dos profissionais brasileiros quanto para o desenvolvimento da Ciência e Tecnologia”, disse Renata Vereza, professora do curso de História da UFF e ex-presidente da Aduff, sobre o fim do Ciências Sem Fronteiras (CSF) para graduandos.

De acordo com a docente, a medida pode ser considerada mais um retrocesso das políticas educacionais do Estado. “Educação  e Ciência  se fazem com trocas. E, ao limitar  essas possibilidades – o que atinge principalmente os alunos mais carentes – o governo reforça  a exclusão e a elitização”, critica.

Cinco anos após a criação desse programa, o governo anunciou que buscar o aperfeiçoamento acadêmico em parceria com universidades internacionais será, a partir de então, prerrogativa apenas de alunos de pós-graduação e de estudantes de baixa renda de escolas públicas, tendo como finalidade o aprendizado de línguas estrangeiras – o que também não é garantido, pois o CSF somente será mantido se houver dotação orçamentária.

O professor de Matemática Carlos Augusto Aguilar Junior, do Colégio Técnico da UFF e 1º tesoureiro da Aduff-SSind, também critica a decisão do governo interino. “O ministro deveria explicar a partir de quais informações ele afirma que o Ciência Sem Fronteiras não atende aos objetivos. Conheço pessoas que já participaram como bolsistas e que relatam como a oportunidade foi proveitosa não só em relação ao aspecto acadêmico, mas como ganho na vida, já que possibilita o contato com outras culturas. Esse é um investimento positivo; não vejo como desperdício de dinheiro público”, analisa o docente.

Para Carlos Augusto, o fim do CSF é mais uma vertente do subfinanciamento da Educação e da Saúde públicas no país – setores que foram drasticamente afetados pela política de contingenciamento de verbas do governo federal desde 2014. “O governo diz não ter dinheiro, mas a verdade é que o déficit orçamentário do país é composto pelo pagamento dos juros da dívida”, critica.

De acordo com o MEC, desde 2011, cerca de 100 mil estudantes já foram enviados para mais de 50 países, tendo custado R$8,4 bilhões aproximadamente aos cofres públicos. Desde montante, R$3,7 bilhões foram disponibilizados somente no ano de 2015, contemplando 35 mil bolsistas.

Em entrevista ao jornal “O Globo” da terça-feira (26), o ministro da Educação, Mendonça Filho, afirmou que cada aluno do Ciência Sem Fronteiras custa cerca de R$105 mil por ano à União. Segundo ele, é necessário reavaliar a iniciativa, sob a alegação de que além de não haver recursos, esses estudantes não estariam bem preparados para frequentar as aulas em universidades dos outros países, pois não têm o conhecimento adequado para compreender o idioma. Além disso, o ministro teria dito que esses alunos estariam fazendo turismo no exterior ao invés de estudarem. O ministro não teria explicado, porém, com base em que dados afirmou isso.

Estudantes reagem à notícia

De acordo com Sara Duarte, estudante do sexto período de Letras na Universidade Federal de Viçosa, as mudanças no CSF representam mais uma consequência das inúmeras tentativas de desmonte do ensino publico e gratuito. “Essa é mais uma tentativa de sucatear a Educação. Temos notícias de diminuição de verba para assistência estudantil, diminuição de verba para programas de pós-graduação, diminuição de bolsas de pesquisa... Tudo isso até chegar ao Ciência Sem Fronteiras, que é um programa que tem muita visibilidade”, disse.

Em breve, Sara terá a chance de passar um período em Portugal para estudar, como bolsista do Programa Licenciatura Internacionais – PLI. “Vou em setembro porque o meu edital é de 2014, sendo esta, portanto, uma verba mais antiga. Mesmo assim, demorou para contarmos com a aprovação da Capes. Quatro das sete bolsas que a faculdade tinha direito foram canceladas”, revelou, evidenciando outra vertente do corte de verbas na Educação. “Esse tipo de iniciativa traz mais qualidade para o ensino superior no Brasil. Tenho muitos amigos que foram e que contam que a experiência é divina”, diz

Para Eduardo Costa, doutorando Ciências Farmacêuticas na UFRJ, que cursou parte do seu aperfeiçoamento na Universidade do Texas, nos Estados Unidos, morar fora e ter contato com acadêmicos e estudantes de diversos países é, de fato, uma experiência enriquecedora para graduandos e pós-graduandos. “Ter tido a oportunidade de estudar no exterior foi muito importante tanto no aspecto pessoal quanto para o aprendizado científico”, diz. “Voltei com uma visão diferente em relação ao meu país, com vontade de contribuir ainda mais para o bem estar da sociedade a qual pertenço; uma pena ver uma iniciativa como o ‘Ciências Sem Fronteiras’ ser esvaziada ou hierarquizada”, complementou.