Jul
15
2016

Frente nacional vai combater projetos que proíbem debate na sala de aula

Frente Nacional Contra o ‘Escola Sem Partido’ faz ato com dezenas de entidades no Rio e tem defesa enfática da unidade contra projeto classificado de mordaça e de fascista
DA REDAÇÃO DA ADUFF
A pergunta do professor Roberto Leher, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, poderia ter sido feita no início da atividade que lançou a Frente Nacional Contra o ‘Escola Sem Partido’ – caberia, talvez, melhor ali, mas ficou para o final. O que leva tantos a se mobilizar para combater um projeto que, por suas características nitidamente inexequíveis e inconstitucionais, deveria ser motivo de piadas alguns anos atrás, indagou o reitor da UFRJ, professor da Faculdade de Educação e militante da esquerda fluminense.
Na avaliação de Leher, o motivo está na atual capacidade de persuasão desse tipo de pensamento em certos setores da sociedade e na “preocupante” receptividade do governo “ilegítimo e ilegal” de Michel Temer (PMDB) a tais propostas. Em outras palavras, disse que o que se assemelha a uma aberração em termos educacionais e democráticos tenta surfar na conjuntura atual e pode se constituir em perigoso instrumento de repressão contra professores.
A dimensão do ato de lançamento da frente corrobora com essa análise. O salão nobre do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ (Ifcs), no Largo de São Francisco de Paula, ficou pequeno para abrigar as cerca de 300 pessoas que compareceram à cerimônia política de lançamento da frente. A Aduff-SSind e o Sindicato Nacional dos Docentes (Andes-SN) participaram e ajudaram na organização do evento.
Representatividade
Não houve, durante a sequência de discursos que saudaram a formação dessa articulação contra o que chamaram de projeto fascista e que tenta impor uma mordaça nas salas de aula, quem não ressaltasse a representatividade e a amplitude do ato, que reuniu quatro centrais sindicais (CSP-Conlutas, CUT, CTB e Intersindical), as principais entidades nacionais da educação pública (Sinasefe, Andes-SN, Fasubra, CNTE, Anel, UNE, Ubes, entre outras), e dezenas de sindicatos, entidades civis e partidos políticos.
Ao p0nto de o professor Gaudêncio Frigotto, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), classificar a atividade de inédita pela pluralidade dentro de um universo que definiu como esquerda. Gaudêncio e Leher foram os dois convidados escolhidos para falar por 15 minutos.
O professor da Uerj também assinalou que não é possível ignorar o projeto tomando-se por base o seu conteúdo – que prevê uma escola neutra e professores que deem lições imparciais para seus alunos e que jamais abordem questões ideológicas. “Não podemos falar que é uma bobagem, ele já está presente na sociedade por sua persuasão”, disse Gaudêncio, destacando que a proposta é inconciliável com a ideia de educar, que pressupõe a formação de um pensamento crítico.
Associação e projetos
O 'Escola Sem Partido', agora convertido em associação, é um movimento de perfil conservador que pretende limitar e controlar a atuação de professores em sala de aula. O teor do que defende serviu de base para projetos apresentados no Congresso Nacional, em pelo menos 12 assembleias legislativas estaduais e em número impreciso de câmaras municipais, entre elas a do Rio de Janeiro.
Apresenta-se como defensor da "neutralidade do ensino", por meio da proibição da "doutrinação ideológica" nas escolas. Entidades e educadores que o contestam, porém, afirmam que por trás dessa neutralidade está a tentativa de cercear a atividade pedagógica e impor a mordaça ao ato de lecionar.
No lançamento da frente, afirmou-se que a neutralidade esconde a intenção de impor a escola do partido único. “O projeto sem partido é de um partido só”, disse a estudante Bia, da federação nacional dos secundaristas, acrescentando que esse partido modelo é racista, machista e homofóbico.
Entre as muitas pessoas que falaram na atividade – por suas entidades sindicais, estudantis, sociais ou partidárias –, a defesa da unidade foi constante. Mas quase sempre acompanhada da constatação de que o momento exige respostas contundentes dos trabalhadores e estudantes. A professora da UFF Eblin Farage, presidente do Sindicato Nacional dos Docentes (Andes-SN), disse que essa articulação não pode ficar restrita à esfera federal e tem que se estender aos educadores estaduais e municipais. “Mais do que nunca é o momento de unificar as lutas, a nossa organização não pode se dar apenas no âmbito federal, é preciso fazer uma luta conjunta”, disse. A docente chamou a atenção para um aspecto dessa disputa: não permitir que essa “direita clássica classifique o debate de gênero como uma questão ideológica”.
Nas mais de duas dezenas de falas, ao ‘Escola Sem Partido’ foram acrescidos projetos como o PLP 257/2016 e a PEC 241/2016, propostas defendidas pelo governo apontadas pelos manifestantes como potencialmente letais para os serviços públicos. O representante da Fasubra, a federação dos sindicatos dos técnicos-administrativos das instituições federais de ensino superior, disse que para deter tais projetos conservadores e contrários aos trabalhadores é “preciso unir todos os que querem construir uma greve geral neste país”.
A insatisfação com o governo Temer, aliás, foi lembrada reiteradas vezes. Em alguns momentos, mais para a sequência final do evento, os participantes gritaram em coro “Fora Temer”. Em outros momentos, cantaram uma palavra de ordem que diz que ‘escola sem partido’ é ditadura militar e que os estudantes tinham o direito de pensar. Algo também lembrado em muitos discursos.  “Esse projeto não é apenas um ataque à liberdade de expressão, [tenta consolidar] como inquestionável toda a realidade colocada para estudantes e trabalhadores”, disse Elena, da Associação Nacional dos Estudantes Livres (Anel).
DA REDAÇÃO DA ADUFF
Por Hélcio Lourenço Filho