Fev
07
2018

#Opinião: Estatização do ensino superior no Chile desafia Banco Mundial

Foto: Reprodução de Internet Foto: Reprodução de Internet / Manifestações no Chile pelo fim da mercantilização da Educação

Por Adriana Machado Penna*

No último dia 24 de janeiro o Congresso chileno aprovou a lei que garante a universalização e a gratuidade do ensino superior naquele país. Devolver o ensino superior à responsabilidade do Estado foi a principal promessa da presidente Michelle Bachelet desde o início de seu segundo mandato (2014-2018). É certo que a estatização do ensino superior na atualidade chilena não está no mesmo patamar dos desafios políticos assumidos pelo então presidente Salvador Allende, ao nacionalizar o cobre em 1971. Naquele momento as reformas propostas por Allende, sobretudo a política de nacionalização da mineração do cobre, desagradou profundamente os interesses econômicos das grandes corporações instaladas no Chile. Note-se que foi este processo um dos principais elementos motivadores do golpe de Estado de 11 de setembro de 1973. Contudo, a aprovação da chamada “Lei das Universidades Estatais” chilena representa um enfretamento real à atual lógica internacional de privatização da educação imposta pelos organismos internacionais aos países da América Latina, bem como representa uma resposta ao processo que se abre desde a instalação da ditadura Pinochet.

Entretanto, resta saber se estudantes e trabalhadores da educação superior conseguirão levar adiante esta conquista, frente ao mandato do próximo presidente eleito em dezembro de 2017, o bilionário Sebastián Piñera, empresário do ramo de comunicação, transporte aéreo, clube de futebol entre outros. O novo presidente irá sustentar esta política que, sem dúvida, é contrária aos interesses do Banco Mundial, da OCDE e do mercado da educação internacional?

Importante destacar que o avanço da privatização da educação chilena desencadeou em 2006 (início do primeiro mando de Bachelet), e em 2011, um dos principais movimentos de resistência da juventude daquele país, desde a ditadura, ficando conhecido como a “revolta dos pinguins”. Movimento este que trouxe inspiração aos estudantes brasileiros, desde 2015, no grande processo de ocupação das escolas de ensino médio e das universidades, fortalecendo a resistência estudantil contra a política de reestruturação das escolas, contra o ajuste fiscal e a brutal redução de repasse de recursos públicos à educação pública, bem como contra a reforma do ensino médio.

Num movimento inverso ao chileno, o governo brasileiro assume mais uma vez a política traçada pelo Banco Mundial. É neste sentido que em novembro de 2017 o Banco Mundial publica o relatório sob o título “Um ajuste justo: análise da eficiência e equidade do gasto público no Brasil”, o qual afirma que um de seus principais achados é o fato de que “programas governamentais beneficiam os ricos mais do que os pobres, além de não atingir de forma eficaz seus objetivos”. Este é o mote do governo Temer na busca por dar suporte aos mecanismos de privatização da educação pública de nível superior, e de naturalização do acesso ao financiamento estudantil, a exemplo do que já acontece com o FIES. De acordo com o relatório este deveria ser o mesmo sistema de financiamento aplicado ao acesso às universidades federais ao assumir a cobrança de “tarifas escolares”.

De fato, não é novidade que historicamente a relação público-privado no campo do ensino superior no Brasil tem sido favorável à mercantilização. Nesta mesma linha o relatório em questão não apresenta novidades frente a seus argumentos já conhecidos por nós desde os anos de 1990, os quais insistem que as universidades públicas no Brasil são espaços cada vez mais propícios às elites, “deixando de fora os pobres”.

O Banco Mundial justifica a necessidade da redução do repasse de recursos públicos às IES, bem como justifica a necessidade de os estudantes passarem a pagar pela própria educação sob a alegação de que “o ensino superior gratuito pode estar perpetuando a desigualdade no país”. Assim, vem tomando corpo o discurso do “alto custo por aluno” sem o retorno de “qualidade esperada”. Ou seja, privatizar o ensino superior seria a chave para a promoção da “equidade”, “eficiência” e para “reduzir o custo fiscal”. Nesta linha, a limitação dos supostos “gastos por aluno” estaria diretamente vinculada à comprovação da eficiência por universidade, incentivando a competitividade entre as instituições bem aos moldes da disputa de mercados.

Diferentemente das últimas conquistas da educação superior chilena, a universidade brasileira, seus trabalhadores e estudantes têm um grande desafio pela frente. A conjuntura atual exige de nós o máximo de organização para revertermos o conjunto de reformas já aprovadas, e para barrarmos as reformas em curso.

*Adriana Machado Penna é doutora em Serviço Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro; professora no Campus Santo Antônio de Pádua da Universidade Federal Fluminense, atuando no curso de Pedagogia e Educação do Campo. Atualmente, é diretora da Aduff-SSind, pela gestão 2016-2018.

Foto: Reprodução de Internet Foto: Reprodução de Internet / Manifestações no Chile pelo fim da mercantilização da Educação

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