Mai
09
2016

“Unidade dos trabalhadores será decisiva para defender serviços públicos”, diz candidato à Aduff

Candidato à presidência da Aduff-SSind pela chapa única , o professor Gustavo Gomes fala sobre os desafios da próxima gestão e da situação da universidade diante da crise política e econômica
Candidato à presidente nas eleições para direção da Aduff-SSind, o professor Gustavo Gomes, do Serviço Social da UFF, não vê caminho isolado para os docentes das universidades públicas enfrentarem a crise, os cortes orçamentários e a continuidade – que, ao que tudo indica vai piorar – das políticas que restringem cada vez mais as margens de atuação dos serviços públicos. Para ele, é preciso aprofundar a organização interna da categoria e firmar alianças com os demais servidores, com os movimentos sindicais e sociais para agregar forças na defesa de todos os direitos da classe trabalhadora. Gustavo destaca que os campi de Niterói e de fora da sede estão bem representados na Chapa 1 – “Democracia e Luta, em Defesa dos Direitos Sociais, do Serviço Público e da Democracia Interna”, que se constitui em um coletivo que pretende renovar e, ao mesmo tempo, fortalecer a tradição democrática da Aduff-SSind.
JORNAL DA ADUFF - A próxima gestão enfrentará um momento particularmente delicado na conjuntura. Provavelmente a presidente Dilma já estará afastada provisoriamente quando a nova diretoria assumir. O que muda? Quais os principais desafios que você observa para os trabalhadores e o sindicato?
GUSTAVO GOMES - Enfrentamos uma conjuntura muito difícil para aqueles que defendem o direito à educação como função primordial do Estado numa sociedade brasileira tão marcada pela injustiça e desigualdade brasileira. Durante a longa greve de 2015, já enfrentamos uma intransigência do governo Dilma em negociar nossa pauta nos pontos referentes, por exemplo, à melhoria das condições de trabalho, à conclusão das obras de expansão e à abertura de novos concursos para técnicos e docentes. Vimos sucessivos contingenciamentos dos recursos de investimento e custeio das IFEs [Instituições Federais de Ensino], enquanto se aumentava o repasse bilionário do orçamento para as instituições privadas de ensino via Fies e Prouni. Isso afetou drasticamente o pagamento de bolsas, as atividades de extensão e as condições de ensino. O provável desfecho da crise política com o impeachment da presidenta não melhorará em nada esse cenário. O golpe institucional pretendido pela direita reacionária pretende acelerar ainda mais as contrarreformas do Estado, com a retirada dos direitos trabalhistas dos servidores, dos direitos sociais e outras conquistas democráticas da maioria população brasileira. Por isso, a organização dos trabalhadores e a atuação ativa dos sindicatos assumem importância decisiva no próximo período.
A chapa traz o seu nome como presidente, que já integrava a gestão que se encerra, mas também muitos docentes que não estavam na direção. A chapa é de continuidade ou renovação?
Eu faço parte da atual diretoria do sindicato e funcionamos de forma colegiada, respeitando a soberania das decisões da categoria aprovadas em assembleia e os princípios de independência e autonomia do Andes diante dos governos, reitorias e partidos políticos. Nesse sentido, pretendemos dar continuidade a essa forma colegiada de funcionamento. Contudo, por outro lado, a nossa chapa para o próximo biênio expressa a renovação da categoria docente e a realidade da multicampia na UFF. A maioria da chapa é de professores que estarão participando pela primeira vez da direção do sindicato e muitos lecionam nos campi fora de sede. Estaremos, assim, em melhores condições para intensificar o diálogo com a totalidade da categoria.
Há quem considere que boa parte dos novos docentes está afastada do sindicato. O que acha? Há algo a ser feito nesse aspecto?
A Aduff tem registrado um crescimento de docentes sindicalizados nos últimos anos. Nossa representação é uma das mais expressivas do Brasil com centenas de filiados ao sindicato. Contudo, de fato, é necessária uma aproximação com os docentes mais jovens que ingressam na universidade já com a vivência da precariedade do trabalho nas instituições privadas de ensino e da repressão à liberdade de organização e crítica. Esses docentes foram os primeiros atingidos pela desestruturação da carreira, pela retirada do direito à aposentadoria integral com a Funpresp, pelo assédio moral e falta de democracia. Mesmo assim, muitas vezes, desconhecem seus direitos e não possuem uma cultura de organização e resistência. Por isso, intensificar o trabalho de base junto aos novos professores será uma prioridade da próxima gestão.
O momento é de unidade com outros setores do funcionalismo e dos movimentos sociais e sindicais ou o melhor é procurar concentrar esforços nas questões específicas e locais?
As duas ações são necessárias e complementares. As questões específicas e locais são resultado da diminuição dos recursos para educação, da política de privatização e da adesão dos reitores ao projeto de sucateamento dos serviços públicos. Esses problemas locais, que causam tanta indignação a todos nós, somente serão resolvidos se combatidos através de articulação nacional. Esta mobilização nacional, por sua vez, somente será possível a partir da denúncia local e cotidiana das condições de trabalho e estudo nas IFEs do Brasil.
A próxima direção de cara enfrentará a ameaça do PLP 257, enviado pela presidente Dilma mas que, na essência, traz propostas que Michel Temer (PMDB) também vem defendendo. Isso preocupa?
Essa é uma das principais preocupações nossas e do Andes. O projeto, que tramita com celeridade por conta do caráter de urgência, pretende desmontar os serviços e a carreira pública. Privatizações, contingenciamento dos recursos orçamentários da educação, congelamento de salários, aumento da contribuição previdenciária dos servidores, suspensão de concursos públicos e até demissão de servidores estáveis são algumas das propostas contidas no projeto. No próximo período, será fundamental a mobilização dos docentes em unidade com os demais servidores e trabalhadores da iniciativa privada para barrar esse retrocesso.
Como fica a luta salarial e pela carreira diante da crise econômica e política?
Mais do que nunca a luta salarial e pela carreira assume uma dimensão política maior porque o projeto em curso avança no sentido oposto à valorização dos serviços públicos e dos servidores públicos. A manutenção dos serviços públicos é condição indispensável para garantir o acesso da maioria da população a educação e melhores condições de vida. Ampliar a democracia no Brasil pressupõe considerar fundamentais os direitos sociais à educação e à saúde. Portanto, não há democracia no Brasil sem serviços públicos, gratuitos e de qualidade para toda a população. A luta dos servidores públicos se confunde então nesse momento com a defesa da própria democracia.
“Truculência da Reitoria marcou cessão do Huap à Ebserh”
Qual avaliação você faz do processo de cessão do Hospital Universitário Antonio Pedro à Ebserh? A Reitoria diz que os sindicatos foram intransigentes…
O reitor, em sua primeira reunião com a atual diretoria, estabeleceu dois compromissos: suspender a expansão universitária enquanto não fossem concluídas todas as obras iniciadas e não transferir o Hospital Universitário Antonio Pedro para Ebserh sem antes um debate franco e aberto com as entidades sindicais e a comunidade acadêmica. Fiquei muito decepcionado, pois esperava que o reitor honrasse os compromissos assumidos voluntariamente. Muitas obras permanecem inacabadas e criou-se o campus de Petrópolis. Quanto à Ebserh, o procedimento foi emblemático em relação ao descaso com as instâncias e a comunidade acadêmica. Cerceamento aos debates, truculência policial, votações fraudadas foram a metodologia adotada com o objetivo de transferir o Huap para uma empresa de direito privado que fere o Regime Jurídico Único dos servidores e a autonomia universitária.
Há algo a ser feito ainda com relação à Ebserh?
A assinatura do contrato com a Ebserh foi ilegítima, pois não houve votação no CUV e contagem de votos. Vários colegiados estão aprovando moções denunciando que os representantes não puderam votar embora estivessem presentes. A assessoria da Aduff está estudando as medidas cabíveis. Outra prioridade é reverter as medidas da empresa que já estão piorando o atendimento aos usuários e o desenvolvimento das atividades de ensino e pesquisa. O problema de má-gestão e subfinanciamento do hospital foram agravados após a assinatura do contrato, com a demissão de dezenas de contratados e o fechamento de leitos.
Com a provável mudança de governo, é previsível que a presidência da Ebserh mude de mãos. Isso pode fazer alguma diferença?
Caso se confirme o golpe institucional, o novo governo pode se utilizar da perda da autonomia universitária para negociar os cargos de gestores e diretores da empresa para saciar a cobiça dos políticos aliados que ajudaram a aprovar o impeachment.
“Com as OS, as universidades podem ser o próximo alvo da privatização das políticas sociais”
As organizações sociais são uma ameaça para a universidade pública?
São uma das maiores ameaças. A experiência das organizações sociais, já aplicadas largamente nos serviços de saúde, demonstra que as mesmas aumentam a corrupção, o clientelismo e o desvio de recursos públicos, precarizam o trabalho dos servidores e prejudicam o controle social sobre os serviços. Por isso, a luta contra as organizações sociais tem sido a principal luta de movimentos como a Frente Nacional contra a Privatização da Saúde. Na prática, a OS extingue a contratação de servidores com estabilidade e desvincula o orçamento das áreas sociais. O vice-presidente Michel Temer e governadores aliados têm defendido e implementado essa via em Estados, como o de Goiás, para gestão privada também na educação. Isso significa que as universidades podem ser o próximo alvo da privatização das políticas sociais.
E o novo marco de ciência e tecnologia para a pesquisa na universidade e no país, o que significa?
Significa um desastre. O novo Código de Ciência e Tecnologia vincula os objetivos da universidade às finalidades lucrativas das empresas comerciais. Transforma o conhecimento produzido nas universidades em mercadorias como outra qualquer. Transforma os departamentos e núcleos de pesquisa em balcões de negócios. Por fim, flexibiliza o regime de dedicação exclusiva com a finalidade de, a médio prazo, extinguir com essa importante conquista da carreira docente.
A questão da democracia na universidade seguirá sendo algo central na atuação da Aduff?
Sim. Por isso, destacamos no lema da chapa a defesa da democracia. Como mencionei anteriormente, a defesa dos direitos sociais e dos serviços públicos se confunde com a defesa das conquistas democráticas. Nenhuma solução para os problemas da UFF e das universidades se apresentará sem a ampla participação da comunidade acadêmica e dos trabalhadores em geral. A importância do sindicato nesse momento se destaca como canal para participação crítica e defesa dos direitos sociais e democráticos.