Nov
28
2012

Movimentos trazem à UFF debate sobre a nova lei federal de cotas

A reserva de vagas para portadores de necessidades especiais em cargos e empregos públicos é prevista pela Constituição Brasileira desde 1988. Em universidades, a reserva de vagas passou a ser adotada em 2001, quando a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) instituiu o sistema de cotas, com reserva de 40% das vagas, para estudantes autodeclarados negros ou pardos – tendo como critério o corte sócio-econômico. Desde então, o tema tem gerado muitas discussões e polêmicas dentro e fora das instituições de ensino.

Atualmente, cerca de 40% das universidades já adotam algum tipo de critério diferenciado para seleção de negros e indígenas – reserva de vagas ou bônus de pontuação. E a tendência é que esses números aumentem: no dia 29 de agosto desse ano, a presidente Dilma Rousseff sancionou a lei que regulamenta o acesso a universidades e institutos federais via cotas. De acordo com a lei, as instituições devem, até 2016, reservar 50% de suas vagas para estudantes oriundos da rede pública de ensino, sendo 25% preenchidos segundo critério de renda familiar (que deve ser de até 1 salário mínimo e meio) e os outros 25% para negros, pardos e índios.

Com o objetivo de discutir o tema e em homenagem ao Dia da Consciência Negra, a Aduff, o Sintuff e o DCE promoveram, no dia 21/11, o debate Consciência Negra: A nova lei para as cotas universitárias. A atividade ocorreu no auditório Florestan Fernandes, na Faculdade de Educação, e contou com a participação da professora Elza Dely Macedo, vice-presidente da Aduff e integrante do GT de Etnia, Gênero e Classe da entidade, e de José Mário Makaíba, do setorial de negros e negras do PSOL e coordenador da organização antiracista Círculo Palmarino.

A professora Elza, que falou sobre essa nova lei, afirmou que “o sistema educacional reproduz a desigualdade econômica da sociedade, e, devido à sua estrutura, a torna perene”, por isso a política afirmativa de cotas se faz necessária como uma tentativa de dar tratamento “diferente aos desiguais para que se alcance a igualdade”. Elza chamou atenção para o fato de que a adesão à política de cotas, ao ganhar força de lei, deixa de ser facultativa.

Makaíba ressaltou a importância da implantação obrigatória da política de cotas, independente do percentual destinado. Segundo ele, mais do que “abrir espaço para um grupo historicamente excluído”, o debate acerca do sistema de cotas “trouxe para a universidade a questão do racismo, que até então era tratado de forma teórica e descolada do meio acadêmico”.

Reivindicando a sanção da lei como uma conquista do movimento negro, José Makaíba traz um questionamento: “por que a lei de cotas agora?”. Na busca de trazer respostas, pontuou alguns momentos vividos pela população negra brasileira: a abolição da escravidão, que caracterizou como uma estratégia para o embranquecimento da classe trabalhadora no país; e a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial em 2012, que atendeu à ideologia de igualdade racial da classe dominante e não a pautas históricas do movimento negro – como foi o caso do sistema de cotas, não aprovado na ocasião.

Partindo disso, Makaíba considera que a lei é uma resposta à reestruturação de movimentos negros organizados, como é o caso de quilombolas, e outras movimentações espontâneas, como o aumento significativo, segundo o IBGE, de pessoas que se autodeclaram negras ou pardas no Brasil. Para Makaíba a lei cumpre ainda uma função de medida compensatória e de tentar prevenir uma explosão social que pode decorrer da crise econômica, que trará cortes em diversos programas do governo federal de transferência de renda, como o Bolsa Família.

Para a professora Elza, o grande mérito do documento, que considera uma “propaganda política do governo”, é chamar atenção para as escolas públicas – já que a condição primeira para a disputa das vagas reservadas é ser estudante da rede pública. Elza acredita que essa medida possa acarretar em uma melhoria do ensino básico público, a partir da migração de uma camada da população que poderia pagar uma escola privada mas passará a escolher a pública por conta da possibilidade do acesso ao ensino superior através das cotas.

Outros pontos destacados foram o tempo de vigência da lei, que deve ser revista dez anos após o início da implementação, e a necessidade de um projeto de assistência estudantil que garanta que os cotistas concluam a graduação para a qual foram aprovados. “A lei sozinha não dá conta da superação das barreiras sociais pré-existentes, é necessário se ter uma política de revalorização do ensino básico público. Assim como as cotas sozinhas não resolvem o problema, precisam vir acompanhadas de programas de permanência para garantir a integralização do ensino.”, afirmou Elza.