Nov
21
2017

"Reforma trabalhista modifica as relações no mercado e fragiliza o trabalhador", disse professora da UFRJ

Luanda Botelho, docente da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e Adhemar Mineiro, economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – Dieese,  debateram a lei 13.467, de 13 de julho de 2017, em debate promovido pela Faculdade de Economia da UFF

Detalhe do debate sobre Reforma Trabalhista, que aconteceu na UFF, dia 13 de novembro. Detalhe do debate sobre Reforma Trabalhista, que aconteceu na UFF, dia 13 de novembro.

A Lei 13.467, de 13 de julho de 2017, a da reforma trabalhista, ainda não tinha entrado em vigor, mas anúncios de emprego já procuravam candidatos a partir de um “novo perfil”: contratação em sistema “intermitente” – conforme a demanda das atividades, reduzindo ou ampliando horários - sem direito a vale refeição ou transporte, com o valor de R$4,45 por hora – essa é a oferta em tempos de crise para aqueles que pretenderem uma vaga nas redes de franquia Bob’s, Balada Mix e Choe’s Gourmet, administrados por uma mesma empresa, em Vitória (ES).

"A nova lei desestabiliza o mercado de trabalho conforme conhecemos, seja pela lógica do indivíduo, seja pelos indicadores sociais", afirmou Luanda Botelho, professora de relações trabalhistas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, que debateu a reforma trabalhista em evento realizado na Faculdade de Economia da Universidade Federal Fluminense. Ela e Adhemar Mineiro, economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – Dieese explicitaram as principais mudanças na legislação, a convite do Núcleo de Estudos em Economia e Sociedade Brasileiras – Neb, no último dia 13 – dois dias após a nova reforma entrar em vigor.

Aprovada pela Câmara dos Deputados, em abril de 2018, e no Senado, em julho passado, as mudanças propostas pela reforma trabalhista alteram substancialmente a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, promulgada em 1943. Apesar dos mais de setenta anos, a legislação passou por várias modificações ao longo das últimas décadas, mas, ainda assim, resguarda o trabalhador perante o empregador.

No entanto, a reforma trabalhista sancionada pelo presidente Michel Temer, na prática, modifica as relações no mercado brasileiro e fragilizam o trabalhador diante do patrão, sobretudo porque prevê a dominância do negociado sobre o legislado, o aumento do número máximo de dias de trabalho temporário, aumento e redução da jornada de trabalho, de salários e da duração de intervalos, entre outros aspectos.

Luanda Botelho criticou as alterações na jornada de trabalho, que preveem que o patrão possa convocar o funcionário a qualquer instante, desde que com três dias de antecedência.  Também condenou o fato de a nova legislação indicar a perda de alguns direitos, como trabalhar em escala 12x36horas, sem receber o pagamento em dobro quando a jornada ocorrer em um domingo ou em um feriado.

Terceirização

Para a professora da UFRJ, a reforma trabalhista tem que ser pensada em conjunto com a regulamentação da terceirização para toda e qualquer atividade.  A docente, que criticou esse modelo de contratação que precariza o trabalhador, revelou dados que evidenciam que 80% dos acidentes em locais de trabalho envolvem funcionários terceirizados. Eles ganham cerca de 30% a menos como salário e trabalham 3h a mais por semana, conforme dados do Dieese. “Entre 2010 e 2013, nove dos dez maiores resgates de trabalhadores em condição análoga a de escravo eram empregados terceirizados”, disse a docente.  

Excludente 

Luanda Botelho também destacou que a reforma trabalhista atinge principalmente as mulheres, que, majoritariamente, acumulam atividades domésticas e laborais. Citou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – Pnad que apontam que, 2005 e 2015, mulheres com mais de 16 anos estão em maior número nas atividades do mercado informal. “A reforma trabalhista permite que gestantes e lactantes, por exemplo, atuem em locais insalubres – o que antes era negado pela lei”, criticou.

A nova legislação trabalhista foi considerada pela palestrante extremamente excludente porque também impossibilita que pessoas com menor escolaridade tenham fácil acesso à justiça. De acordo com as novas regras, como aponta Luanda, o empregado que antes era beneficiado pela justiça gratuita e que acha que foi lesado, se desejar mover ação contra o empregador terá que custear as despesas do processo trabalhista. “A impressão que dá é a de que querem amedrontar e, por consequência dificultar, o acesso do empregado à Justiça do Trabalho”, disse a docente da UFRJ.

Ela criticou ainda o fato de o papel dos sindicatos serem esvaziados nos termos dessa nova legislação, que, encerra a contribuição sindical obrigatória e na prática, dispensa as entidades sindicais de acompanharem o trabalhador durante a rescisão contratual. “Isso desestrutura a relação entre a categoria e os sindicatos”, disse.

Luanda também revelou que, de segundo as novas regras, se a demissão ocorrer em comum acordo, o empregador não necessita mais pagar 40% de multa pelo FGTS; o trabalhador levará apenas 20% sob o Fundo de Garantia e somente poderá resgatar 80% do valor acumulado, sendo ainda mais penalizado.

Falácia

O economista Adhemar Mineiro, do Dieese, disse que a reforma trabalhista está inserida no contexto maior de predominância do neoliberalismo, que ganhou a Europa nos anos 1980 e, na década seguinte, tomou fôlego no Brasil.  

Afirmou ainda que a nova legislação trabalhista de Temer é um dos grandes retrocessos promovidos pelo governo, assim como a regulamentação da terceirização, e a proposta de reforma previdenciária. A nova legislação trabalhista esvazia o papel do Estado, reduz a ação sindical e retira direitos individuais. Esse pacote reformista que atende exclusivamente aos interesses do mercado e dos grandes empresários deve ser analisado à semelhança do que ocorreu em países da Europa, que privilegiaram o modelo rentista de economia, nos últimos anos. 

Os defensores dessa agenda que retira direitos alegam que é necessário 'modernizar' as relações de trabalho no país, o papel do Estado e ainda apontam que a nova legislação pode estimular a economia e criar empregos – o que para Adhemar é um argumento bastante frágil. “Vimos que a crise de 2008 não foi apenas uma ‘marolinha’ –é o nível de atividade produtiva de um país que determina a oferta de salário e de emprego; quando se flexibiliza as leis trabalhistas, a crise se aprofunda", disse o economista. 

DA REDAÇÃO DA ADUFF | Por Aline Pereira 
Foto: Luiz Fernando Nabuco 

 

Detalhe do debate sobre Reforma Trabalhista, que aconteceu na UFF, dia 13 de novembro. Detalhe do debate sobre Reforma Trabalhista, que aconteceu na UFF, dia 13 de novembro.

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