Mai
31
2023

“PL 490 é a síntese do genocídio legislado de nosso povo”

Em ato contra Marco Temporal, no Rio, povos indígenas e apoiadores afirmaram “legado de destruição” do PL 490 e reforçaram que sem demarcação das terras indígenas não há democracia. Aduff participou da manifestação. Mesmo sob de protestos em todo o país, PL foi aprovado na Câmara. Luta segue para barrar projeto no Senado e para garantir que STF julgue a inconstitucionalidade da tese do marco temporal

Com 283 votos favoráveis e 155 contrários, a Câmara dos Deputados aprovou na noite desta terça-feira (30) o Projeto de Lei 490/07, mais conhecido como PL do Marco Temporal. O texto aprovado prevê a aplicação da tese do marco temporal na demarcação de territórios indígenas.

De acordo com a proposta, novas terras indígenas só poderiam ser demarcadas se estivessem ocupadas pelos povos na data 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. O texto também retira a demarcação de terras da alçada da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e devolve a atribuição ao Ministério da Justiça e Segurança Pública.

O Ministério dos Povos Indígenas (MPI), comandado por Sônia Guajajara, divulgou nota pública classificando a aprovação do marco temporal pelos deputados federais como um “genocídio legislado”. O mesmo termo foi utilizado no ato que aconteceu na tarde de terça-feira (30), no centro do Rio de Janeiro.

Povos indígenas e apoiadores se concentraram em frente ao Museu do Amanhã e foram até a sede da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, em ato que denunciou a inconstitucionalidade da tese do marco temporal, o legado de destruição e o caráter genocida do projeto.

Presente no ato, a estudante Juliana Gomes, do Coletivo de Estudantes Indígenas da UFF, afirmou que o PL 490 “perpetua o roubo de terras indígenas pelo latifúndio e pelo garimpo” e que “a roda da colonização continua a girar”. A estudante frizou a inconstitucionalidade do marco temporal. “É um marco inventado que ignora as invasões de terra que expulsaram povos indígenas de seus territórios. A nossa história não começou em 1988. Brasil é nome de árvore, Brasil é terra indígena”, afirmou.

Vale ressaltar que o Supremo Tribunal Federal marcou para o dia 7 de junho o julgamento sobre a legalidade da tese do Marco Temporal. Com status de repercussão geral, a decisão servirá de diretriz para todos os processos de demarcação de terras indígenas no país.

Para os povos indígenas, a aprovação do PL 490 na Câmara é uma tentativa da bancada ruralista de esvaziar o julgamento do STF, suspenso por pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes. Até o momento, foram proferidos dois votos: o do relator, ministro Edson Fachin, que se manifestou contra o marco temporal, e o do ministro Nunes Marques, a favor. 

Para a estudante da Unirio, Isabella Kariri, o PL 490 e a tese do marco temporal tentam apaga a história dos povos indígenas. “Após tantas lutas, querem tirar o que a gente conquistou na Constituição Federal. Dizem que a gente vive no passado, mas eles que não compreendem o tempo. Os povos indígenas são o presente, lembram do passado e constroem o futuro. Avançando sobre nossos territórios, destruindo o bioma, não vai sobrar nada, só o legado da destruição. Não iremos deixar”, disse.

Presente na manifestação, a diretora da Aduff-SSind Eliane Arenas Mora levou ao ato a solidariedade e o apoio da entidade aos povos indígenas. “A luta dos povos originários contra o Marco Temporal e pela demarcação das terras indígenas é a nossa luta. Não é uma luta só pela terra, é uma luta para manter o planeta vivo, com seres humanos vivos. Para garantir a terra desses povos, a cultura desses povos e aprender com eles como se vive a vida não só a partir dos interesses de um pequeno grupo capitalista, mas como nós, seres humanos, nos relacionamos com a mãe terra. Essa é a mãe que a gente quer salvar”, destacou.

Da etnia Guajajara e professora da educação escolar indígena, Martinha Mendonça pontuou que o marco temporal é um de tantos dos retrocessos que sofre a pauta indígena no país. “A gente diz não ao marco temporal porque ele tenta acabar com o direito originário às terras indígenas. Se não existia Brasil antes da colonização, já existia Pindorama. Se não existia América Latina, já existia Abya Yala. Então todo esse território é território indígena”, lembrou.

Egressa da UFF e professora da Escola Municipal Indígena Guarani Kyringue Arandu'a, em Maricá, Martinha reiterou a importância de toda a população brasileira, não só a indígena, se comprometer com a luta pelo futuro do país e da humanidade.

“O Marco Temporal irá colocar em cheque a educação indígena, a saúde indígena, o futuro dos jovens e principalmente o presente. O genocídio indígena continua, ele nunca esteve distante nestes 523 anos de luta. O marco temporal ataca a vida dos povos indígenas e, consequentemente, se são esses os que mais protegem a natureza e garantem o futuro da humanidade, as vidas de todos aqueles que não são indígenas também estão em risco”, alertou.

Da Redação da Aduff | por Lara Abib

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