Nov
26
2020

Após recurso negado, PDS Osvaldo de Oliveira intensifica chamado por solidariedade na luta contra despejo

Assentamento do MST em Macaé é referência na produção agroecológica e está sob risco de despejo após decisão de reintegração de posse do desembargador Marcelo Pereira da Silva; MST irá recorrer em Brasília - Aduff se solidariza com famílias, repudia despejo e reafirma luta por Reforma Agrária

Após terem o recurso negado no Tribunal Regional Federal (TRF-2), em julgamento realizado na quarta-feira (25), as 63 famílias que vivem no Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) Osvaldo de Oliveira, do MST, em Macaé, continuam correndo o risco de despejo. O TRF-2 foi o mesmo que, por 2 votos a 1, determinou a reintegração de posse da área anteriormente conhecida como Fazenda Bom Jardim e a dissolução do assentamento, em agosto de 2019.

Curiosamente, o argumento do desembargador Marcelo Pereira da Silva para pedir e defender a reintegração de posse do território foi justamente o da “preservação da área”. Abandonado e degradado, o latifúndio foi declarado improdutivo desde 2010, tornando-se disponível para fins de reforma agrária. Após uma série de despejos e novas ocupações, em 2014 o INCRA formalizou a criação do assentamento, dando posse às famílias para que se instalassem de forma permanente na área. Hoje o PDS é referência na produção agroecológica no estado do Rio, aliando a preservação e o manejo ambiental que esse formato de assentamento requer, com o plantio de alimentos saudáveis como o de feijão, abóbora, aipim, banana, verduras, entre outros.

Para Ary Miranda, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) da Fiocruz e membro do Conselho Gestor que acompanha - junto a outros representantes de entidades públicas e federais - este assentamento de modalidade diferenciada, é urgente a luta direta e irrevogável contra o despejo das famílias do PDS Osvaldo de Oliveira. “Precisamos barrar essa medida, que não tem base em nada, a não ser na mentira, desmentindo publicamente os absurdos colocados nesse processo. As fotos de satélites comprovam que o território está muito melhor preservado com as famílias, com uma espetacular recuperação de uma área antes devastada e que hoje, pelo trabalho digno dessas pessoas, produz alimento para merenda escolar, para as feiras locais. O que mais eles querem?”, questionou o pesquisador, em audiência popular em defesa do Osvaldo de Oliveira, realizada online pelo MST.

Além de produzir para as feiras agroecológicas locais e dos municípios vizinhos, o PDS Osvaldo de Oliveira também participa do Programa Nacional de Apoio à Alimentação Escolar (PNAE) de Macaé.

De acordo com a advogada e representante das famílias do PDS Osvaldo de Oliveira, Fernanda Vieira, o desembargador Marcelo Pereira da Silva utilizou a perícia produzida pelo proprietário da Fazenda Bom Jardim para sustentar seu voto pela reintegração de posse e pela dissolução do PDS. “A perícia sobre a qual o desembargador-relator se referiu quando justificou seu voto, argumentando que as famílias não preservariam o meio-ambiente, foi produzida pelo proprietário. Não foi produzida pelo Ministério Público Federal, pelo Ibama, pela Polícia Federal ou muito menos feita em parceria com a universidade - que vem acompanhando o processo de recuperação ambiental e, acima de tudo, a capacidade incrível desse assentamento de produzir. Ele ignorou todas essas e escolheu a perícia do latifúndio para sustentar seu voto. Isso o Dr. Marcelo não disse”, aponta.

Agora, o MST irá recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), além de requerer o efeito suspensivo da decisão até que ela seja julgada pelos tribunais superiores. “Essa não é a última etapa do processo. Iremos recorrer para Brasília e retomar toda a movimentação para que consigamos demonstrar mais uma vez que o PDS Osvaldo de Oliveira é de interesse social não só para as famílias, mas para a produção da vida”, afirma a advogada, que classifica como “um crime e uma violação grave aos direitos humanos” a ameaça de despejo em plena pandemia.

O MST também está circulando com um abaixo-assinado em defesa da permanência do assentamento. É possível apoiar a petição on-line de forma individual ou institucional. A Aduff-SSind e o Andes-SN são signatários do documento. Para Kátia Marro, professora da UFF de Rio das Ostras e uma das convidadas a falar na audiência popular realizada na quarta (25), as famílias são guardiãs do território e a decisão pelo despejo, no contexto de pandemia, é de uma irresponsabilidade pública absurda, podendo ser classificada como um genocídio social.

“Falo em nome de um grupo de docentes que acompanha essas famílias há 10 anos, quando ocuparam a terra para pressionar o poder público para avançar na reforma agrária. Além da recuperação ambiental do terreno, é importante falarmos da recuperação social dessas 63 famílias. Fui testemunha da melhoria das condições de vida das pessoas, agora com acesso à terra, ao emprego, à renda e à proteção social, evidenciando-se a melhoria de diversos indicadores sociais. Como assistente social, gostaria de destacar como esse território, em processo de consolidação da reforma agrária, é uma porta de entrada aos direitos sociais e ao exercício da cidadania para a população do campo, em sua dimensão não só individual, mas coletiva”, enfatiza.

A professora ressalta que a UFF de Rio das Ostras atua junto ao PDS, desenvolvendo uma série de trabalhos de pesquisa, assessoria e de formação com as famílias, além de subsidiar o diálogo com o poder público, trabalhando em parceria com as secretarias municipais de saúde, de educação e de assistência social de Macaé.

“Na perspectiva da Universidade Pública socialmente referenciada que defendemos, a experiência do PDS Osvaldo de Oliveira retrata muitas outras conquistas que não se encerram na materialização da Reforma Agrária. A articulação do tripé ensino, pesquisa e extensão ganha vida nos diversos trabalhos desenvolvidos pelos docentes das Universidades Públicas da região (UFF de Rio das Ostras e de Macaé e UFRJ de Macaé), mostrando como esses espaços são fundamentais para a formação profissional de pesquisadores, estudantes e futuros profissionais. O único lado possível é em defesa do PDS Osvaldo de Oliveira e dessas famílias”, finaliza a docente.

Da Redação da Aduff | Por Lara Abib, com informações do Brasil de Fato

 

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