Em meio a tantos retrocessos que afetam as áreas essenciais de um país, a exemplo do que ocorre em relação ao meio ambiente, economia, direitos trabalhistas e saúde, o governo federal regride gravemente em mais um setor ao lançar, no dia 30, a nova Política Nacional de Educação Especial (PNEE). A medida foi apresentada poucos dias após a Data Nacional de Luta das Pessoas com Deficiência, 21 de setembro, que reivindica o fim do preconceito, do capacitismo e lutas pela real inclusão e participação, em igualdade de condições, das pessoas com deficiência na sociedade - cerca de 24% da população brasileira, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
De acordo com a assessoria governamental, a medida tem por objetivo "ampliar o atendimento educacional especializado a mais de 1,3 milhão de educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação no país".
Segundo o governo federal, o PNEE deve garantir mais “flexibilidade aos sistemas de ensino”, a partir da oferta de “classes e escolas comuns inclusivas, classes e escolas especiais, classes e escolas bilíngues de surdos, segundo as demandas específicas dos estudantes”. Afirma ainda que o PNEE “pretende aumentar o número de educandos que, por não se beneficiarem das escolas comuns, evadiram em anos anteriores”.
De acordo com Marinalva Oliveira, docente da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é preciso dizer não à segregação em escolas especiais das pessoas com deficiência.
“A Política Nacional de Educação Especial, além de ser imposta sem nenhuma discussão democrática, é um retrocesso aos direitos das pessoas com deficiência que foram conquistados com muita luta. As mudanças propõem, como ESCOLHA, o retorno das escolas e classes especiais como modelo segregador e anula o princípio 'da educação como direito e para todos em um Sistema Educacional Inclusivo' e com condições de acessibilidade e permanência adequadas”, explica a professora, que coordena o Laboratório de Inclusão, Mediação simbólica, desenvolvimento e aprendizagem (LIMDA) da UFRJ. Ela é também é mãe de Gabriel, que tem síndrome de Down. É ex-presidente do Andes-SN e atua fortemente contra o capacitismo – perspectiva que toma as pessoas com deficiência tal como se fossem vítimas ou incapazes, ao mesmo tempo em que prega uma adequação às regras normalizadas e consensuadas socialmente a partir da falsa concepção de igualdade de oportunidades para todos.
Para Marinalva Oliveira, o PNEE restaura a educação especial – atualmente transversal a todos os níveis, etapas e modalidades do ensino comum e de caráter complementar ou suplementar – como modalidade escolar e substitutiva da educação regular. “A nossa luta é por ampliação dos direitos dos estudantes com deficiência à inclusão escolar. Ter liberdade de ESCOLHA não é retornar as escolas e classes especiais, mas garantir os direitos da população no processo educacional, inclusive com ampliação de recursos públicos para efetivação da inclusão escolar. Se tiver condições de acessibilidade e permanência adequadas nas escolas, nenhuma pessoa com deficiência necessita de escolas e classes especiais”, afirma a especialista.
Segundo ela, as mudanças propostas pelo governo federal representam um retrocesso à concepção de inclusão escolar como direito humano e violam a LBI - Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência. “Igualdade de oportunidades, acessibilidade e não discriminação são temas inerentes aos direitos humanos e representam aspectos do respeito e da valorização da diversidade humana. A nossa luta é para assegurar e avançar em todos os direitos, por isso vamos junto(a)s e nenhum passo atrás por nosso(a)s filho(a)s. Pela emancipação humana, não à segregação”, defende Marinalva Oliveira.
Da Redação da ADUFF