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Out
01
2020

Documentos da reforma administrativa sob sigilo 'alimentam' denúncias sobre reais intenções do governo

Denúncias sobre o que o governo pretende fazer dos serviços públicos com a reforma administrativa foram levadas aos primeiros atos de rua contra a PEC-32: Bolsonaro quer destruir o que existe e criar um 'cabide de emprego', disseram manifestantes

Manifestantes nas escadas da Câmara de Vereadores do Rio, na Cinelândia, no ato realizado na quarta (30) Manifestantes nas escadas da Câmara de Vereadores do Rio, na Cinelândia, no ato realizado na quarta (30) / Cléver Felix/especial para a Aduff

Cartazes levados às ruas nas manifestações presenciais realizadas na quarta-feira, 30 de setembro de 2020, expuseram de forma direta o que muitos servidores públicos e suas entidades sindicais representativas pensam da reforma administrativa. "Querem transformar o serviço público em cabide de emprego", estampava um deles, levado por um manifestante no ato realizado em Florianópolis, em Santa Catarina. "Não à reforma administrativa: ela é contra o serviço público", alertava outro levado ao ato no Centro do Rio de Janeiro.

Denúncias e afirmações como essas talvez expliquem as razões que levaram o governo federal a blindar os documentos que embasaram a formulação da Proposta de Emenda Constitucional 32/2020, que altera a administração pública e terá impactos severos sobre os serviços públicos.

A informação, divulgada esta semana, provocou espanto e uma pergunta: o que esconde o governo de Jair Bolsonaro em relação aos dados e intenções referentes à reforma administrativa? De certa forma, a primeira jornada de manifestações articuladas nacionalmente, com atos virtuais e presenciais, parece ter respondido nas ruas e nas redes sociais à indagação, quando denunciou o governo como inimigo do funcionalismo e do setor público. Os sindicatos afirmam que o Ministério da Economia manipula dados sobre as reais despesas com servidores no país.

O papel de inimigo do servidor, aliás, por mais que para muitos esteja evidente nos atos e medidas oficiais, ganhou ares involuntariamente confessionais quando a reunião ministerial de 22 de abril tornou-se pública, por decisão judicial. Sem ela, isso provavelmente jamais teria vindo a público de forma tão direta.

Não foi por iniciativa do governo que o sigilo sobre os documentos usados para elaborar a reforma foi revelado. Mas em resposta a um pedido de acesso a informações com base na lei que regula esse direito (LAI), movido pelo jornal "O Globo". O Ministério da Economia alegou que os documentos não podem ser divulgados enquanto a proposta estiver sob análise do Congresso Nacional. 

Comunicado da pasta tenta explicar: “Documento preparatório é aquele documento formal utilizado como fundamento da tomada de decisão ou de ato administrativo, a exemplo de pareceres e notas técnicas. Neste sentido, de se observar que a matéria está pendente de ato decisório conclusivo, tendo em vista que é uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), a qual ainda encontra-se em análise no Congresso, somente podendo ser tido como editado após a conclusão de toda a tramitação necessária. Assim, não é possível a disponibilização do seu conteúdo neste momento”.

O ministério comandado pelo ministro Paulo Guedes, aquele que na reunião ministerial comemorou ter posto a granada 'congelamento salarial' no bolso do inimigo servidor, disse que vai divulgar os documentos após o término da tramitação da proposta no Legislativo. 

O jornal informou que solicitou as informações no dia 3 de setembro, data em que a proposta chegou ao Congresso Nacional. O pedido consistia ter acesso à "íntegra dos documentos relacionados a elaboração da Proposta de Emenda Constitucional que trata da reforma administrativa”.

Esse filme não é inédito neste governo quando propostas impopulares estão em pauta no Congresso. Foi assim com a reforma da Previdência, aprovada em 2019, sem que dados atuariais sobre os regimes previdenciários que estavam sendo profundamente alterados fossem apresentados. Com a reforma administrativa, os números divulgados pelo Ministério da Economia para justificar a medida, como as despesas referentes aos servidores no Brasil, foram apontados pelos manifestantes que foram às ruas como grosseiramente falsos - algo que os documentos sigilosos talvez possam pôr a nu.

DA REDAÇÃO DA ADUFF
Por Hélcio Lourenço Filho

Manifestantes nas escadas da Câmara de Vereadores do Rio, na Cinelândia, no ato realizado na quarta (30) Manifestantes nas escadas da Câmara de Vereadores do Rio, na Cinelândia, no ato realizado na quarta (30) / Cléver Felix/especial para a Aduff