Cartazes levados às ruas nas manifestações presenciais realizadas na quarta-feira, 30 de setembro de 2020, expuseram de forma direta o que muitos servidores públicos e suas entidades sindicais representativas pensam da reforma administrativa. "Querem transformar o serviço público em cabide de emprego", estampava um deles, levado por um manifestante no ato realizado em Florianópolis, em Santa Catarina. "Não à reforma administrativa: ela é contra o serviço público", alertava outro levado ao ato no Centro do Rio de Janeiro.
Denúncias e afirmações como essas talvez expliquem as razões que levaram o governo federal a blindar os documentos que embasaram a formulação da Proposta de Emenda Constitucional 32/2020, que altera a administração pública e terá impactos severos sobre os serviços públicos.
A informação, divulgada esta semana, provocou espanto e uma pergunta: o que esconde o governo de Jair Bolsonaro em relação aos dados e intenções referentes à reforma administrativa? De certa forma, a primeira jornada de manifestações articuladas nacionalmente, com atos virtuais e presenciais, parece ter respondido nas ruas e nas redes sociais à indagação, quando denunciou o governo como inimigo do funcionalismo e do setor público. Os sindicatos afirmam que o Ministério da Economia manipula dados sobre as reais despesas com servidores no país.
O papel de inimigo do servidor, aliás, por mais que para muitos esteja evidente nos atos e medidas oficiais, ganhou ares involuntariamente confessionais quando a reunião ministerial de 22 de abril tornou-se pública, por decisão judicial. Sem ela, isso provavelmente jamais teria vindo a público de forma tão direta.
Não foi por iniciativa do governo que o sigilo sobre os documentos usados para elaborar a reforma foi revelado. Mas em resposta a um pedido de acesso a informações com base na lei que regula esse direito (LAI), movido pelo jornal "O Globo". O Ministério da Economia alegou que os documentos não podem ser divulgados enquanto a proposta estiver sob análise do Congresso Nacional.
Comunicado da pasta tenta explicar: “Documento preparatório é aquele documento formal utilizado como fundamento da tomada de decisão ou de ato administrativo, a exemplo de pareceres e notas técnicas. Neste sentido, de se observar que a matéria está pendente de ato decisório conclusivo, tendo em vista que é uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), a qual ainda encontra-se em análise no Congresso, somente podendo ser tido como editado após a conclusão de toda a tramitação necessária. Assim, não é possível a disponibilização do seu conteúdo neste momento”.
O ministério comandado pelo ministro Paulo Guedes, aquele que na reunião ministerial comemorou ter posto a granada 'congelamento salarial' no bolso do inimigo servidor, disse que vai divulgar os documentos após o término da tramitação da proposta no Legislativo.
O jornal informou que solicitou as informações no dia 3 de setembro, data em que a proposta chegou ao Congresso Nacional. O pedido consistia ter acesso à "íntegra dos documentos relacionados a elaboração da Proposta de Emenda Constitucional que trata da reforma administrativa”.
Esse filme não é inédito neste governo quando propostas impopulares estão em pauta no Congresso. Foi assim com a reforma da Previdência, aprovada em 2019, sem que dados atuariais sobre os regimes previdenciários que estavam sendo profundamente alterados fossem apresentados. Com a reforma administrativa, os números divulgados pelo Ministério da Economia para justificar a medida, como as despesas referentes aos servidores no Brasil, foram apontados pelos manifestantes que foram às ruas como grosseiramente falsos - algo que os documentos sigilosos talvez possam pôr a nu.
DA REDAÇÃO DA ADUFF
Por Hélcio Lourenço Filho