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Set
14
2020

É mais uma violência contra mulheres, diz docente sobre desrespeito à redução de horas para mães

 Mulheres docentes da UFF relatam os impactos do trabalho remoto na pandemia em meio ao cuidado com filhos quando a resolução do CEPEx de redução de carga horária é desrespeitada

“Não estamos de férias, estamos no meio de uma pandemia, com crianças ansiosas em casa e tendo que trabalhar. A expressão home office me irrita, porque parece que estamos tranquilas, em um escritório arrumado, mas estamos em meio a cocôs, fraldas e outras demandas”, diz uma das docentes ouvidas pela reportagem da Aduff. Ela é uma das profissionais que questiona o fato de alguns departamentos da UFF não cumprirem o artigo 12 da resolução nº 160/2020 do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão – CEPEx.

De acordo com a normativa, está prevista a redução de carga horária de docentes “que se responsabilizam pelo cuidado de crianças, idosos e pessoas com deficiência” durante o período excepcional de ensino remoto na Universidade.  Apesar disso, a Aduff tem recebido denúncias, principalmente de professoras, de diferentes campi da instituição, que não estão conseguindo a flexibilização em seus departamentos.

"A não redução de carga horária é muito pesada para as mães, porque temos que participar de reunião, estudar, preparar a aula, dar uma boa aula, refazer nosso planejamento porque o ensino remoto não é a mesma coisa de estar presencialmente, temos que aprender as ferramentas", diz a docente. "A deliberação do CEPEx foi muito rasa”, considera.

De acordo com a pesquisadora, que não será identificada, o cotidiano em meio à quarentena está sendo enlouquecedor, sobretudo depois que ela perdeu familiar para a covid-19. "Fico com as crianças e não tive redução de carga horária. Estou me adaptando às rotinas e ao sistema no contexto de pandemia e com as crianças pequenas, que têm demandado questões emocionais", explicou.

Ela afirma estar muito ansiosa com a necessidade de cumprir 1.800 horas anuais. “É mais uma violência contra as mulheres. Tenho tido várias crises de saúde, tenho me tratado, comecei medicação, mas não é fácil. Acho que a UFF não está levando em consideração a diferença entre os professores. Ser mulher e mãe é diferente de não ter filhos ou ter uma paternidade superficial. Aqueles que cuidam dos seus filhos sabem como é”, diz.

Outras duas docentes também foram ouvidas pela reportagem e apontaram que o artigo 12 não é claro em relação a atividade que deve ser flexibilizada. "A resolução não esclarece em que condições isso vai ser feito e como isso vai ser aceito pelos demais", diz uma outra entrevistada que também terá o nome preservado.

Há departamentos, por exemplo, recomendando que tal redução de carga horária se dê em ações como a pesquisa e a extensão.  Não preveem que as professoras precisam preparar aulas e estar disponíveis em um horário fixo para atividades em tempo real. “A brecha está na própria resolução que diz que fica a cargo de cada departamento. Mas aí o departamento diz que não pode flexibilizar a carga horária para você e você se vê explicando o óbvio”, afirma outra docente da UFF. 

Ipea: efeitos sociais da pandemia atingem mais as mulheres

De acordo com um recente levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - Ipea, a participação das mulheres no mercado de trabalho é a menor em 30 anos. Além disso, a exclusão das atividades laborais em tempo de pandemia afeta muito mais as mulheres que têm filhos pequenos, de até dez anos. 

Segundo os pesquisadores, a perda de espaço das mulheres pode ser em parte explicado pelo fato de que elas estão em alguns dos setores que foram muito afetados pela crise da covid-19, entre eles o comércio, serviços e hotelaria. Com as escolas com atividades presenciais suspensas, as mulheres também estão se dedicando mais às necessidades das crianças reclusas em casa e conciliando tais necessidades às demandas domésticas – limpeza, cozinha e afins. 

“A pandemia evidenciou que a carga ainda é mais pesada para as mulheres - grupo social mais vulnerável ao desemprego, à violência doméstica ou à sobrecarga de tarefas profissionais, domésticas e maternas. Algumas contam com a participação de companheiros (as) na divisão das atividades. Mas há também as mulheres que moram sozinhas com suas crias e se veem ainda mais assoberbadas na organização do cotidiano. Por esse motivo, é urgente que os departamentos e institutos da UFF cumpram o artigo 12 da resolução nº 160/2020 do CEPEx”, defende Marina Tedesco, presidente da Aduff.

Da Redação da ADUFF

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