Jul
22
2020

Aprovação do Fundeb na Câmara derrota tentativa do governo de desviar recursos da educação

Resultado foi recebido como importante vitória por entidades sindicais da educação; PEC agora está com Senado

Sessão do Plenário da Câmara na quarta-feira (21), que aprovou por videoconferência a PEC Sessão do Plenário da Câmara na quarta-feira (21), que aprovou por videoconferência a PEC / Reprodução videoconferência

O governo de Jair Bolsonaro foi derrotado na sua tentativa de inviabilizar a aprovação do fundo de financiamento para educação básica sem que recursos fossem desviados do setor. Essa foi a avaliação predominante na Câmara dos Deputados e entre dirigentes sindicais do setor logo após a votação da proposta de emenda constitucional que torna o Fundeb permanente e amplia seus recursos a partir de 2021. A PEC 15/2015 será agora apreciada pelo Senado Federal. Na sessão do Plenário da Câmara, realizado por videoconferência no dia 21 de julho de 2020, a proposta recebeu 499 votos a 7 em primeiro turno e, no segundo, 492 a 6.

Há um ano e meio a matéria está em discussão na Câmara. Deputados afirmam que o governo jamais se dispôs a debater o tema ou apresentar propostas. A defesa do Fundeb envolveu diversos segmentos da sociedade civil, entre eles entidades sindicais. “A aprovação da PEC impôs uma grande derrota ao governo, que tentou inclusive apresentar a proposta de que o novo Fundeb só passasse a valer a partir de 2022. E, embora ainda não tenhamos conquistado o percentual desejado de recursos para a educação básica, avaliamos como vitória, uma vez que a PEC inclui o Fundo na Constituição de forma permanente, e não mais com prazo de validade, como o atual, que vence em dezembro”, avaliou Eblin Farage, professora da Universidade Federal Fluminense e secretária-geral do Andes-Sindicato Nacional dos Docentes, em declaração à imprensa da entidade.

O Palácio do Planalto tentou usar a votação do Fundeb para direcionar dinheiro para um programa de assistência social que planeja lançar, uma espécie de Bolsa Família com outro nome: Renda Brasil. O objetivo era conseguir desviar dinheiro do fundo - que não está submetido ao teto de gastos imposto pela Emenda Constitucional 95 - para o programa assistencial. A EC 95 congela as despesas da União com serviços públicos e políticas sociais até 2036. “Ao invés de propor a revogação dessa emenda criminosa, o governo queria usar recursos da educação pública, que já não são suficientes, para outra finalidade, reforçando seu caráter de inimigo da educação pública”, criticou Eblin.

No debate na Câmara, nenhum deputado se manifestou contra a instituição de um projeto que caminhe para uma renda mínima - a ideia, inclusive está longe de ter o atual governo como autor e há propostas neste sentido no Congresso Nacional. As críticas foram ao fato de o governo Bolsonaro querer contrapor a educação pública a um projeto assistencial. 

Essa movimentação também buscava iniciar uma política que tem defensores no governo de substituir instituições públicas pela concessão de vales (voucher), a serem usados pelas famílias em creches particulares. O Planalto fracassou nessa transferência direta de recursos públicos para empresas privadas do setor, mas o texto aprovado prevê a possibilidade de que parte do dinheiro do fundo seja destinado a convênios com organizações privadas sem fins lucrativos.

Sem apoio, o governo do presidente Jair Bolsonaro acabou se vendo obrigado a uma série de recuos. Desistiu de forçar a transferência de metade da verba extra que entrará no fundo para o programa assistencial, da imposição do limite de 70% no uso dos recursos para pagar salários de educadores e de apresentar os destaques como o que excluía a previsão do CAQ (Coeficiente-Aluno-Qualidade) - que estabelece metas de qualidade no ensino e está diretamente associada aos recursos investidos na educação básica por aluno. Também desistiu de inserir a permissão para que o fundo seja usado para estados e municípios pagarem aposentadorias e pensões.

 

Pontos da PEC aprovada na Câmara que serão submetidos ao Senado:

Aumento gradativo dos recursos

A contribuição da União para o Fundeb crescerá de forma gradativa de 2021 a 2026, passando dos atuais 10% para 23% do total do fundo. A elevação do percentual começará em 2021 com 12%; passando para 15% em 2022; 17% em 2023; 19% em 2024; 21% em 2025; e 23% em 2026. A complementação do governo federal continuará sendo distribuída entes federativos que não alcançarem o valor anual mínimo aplicado por aluno na educação. Em 2019, o Fundeb distribuiu R$ 156,3 bilhões para a rede pública. Atualmente, o fundo garante dois terços dos recursos que os municípios investem em educação. Os repasses da União não entram no teto de gastos fixado pela Emenda Constitucional 95. 

Desigualdades regionais

Dos 13% a mais que a União irá destinar ao Fundeb, até 2026, 10,5% deverão complementar cada rede de ensino municipal, distrital ou estadual sempre que o valor anual total por aluno (VAAT) não atingir o mínimo definido nacionalmente. Após acordo com o governo, pelo menos metade do dinheiro (5%) deverá ser destinada à educação infantil. A PEC prevê inclusive a eventual destinação desse recurso para escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas.

Piso para gastos com salários
No mínimo 70% dos recursos deverão pagar salários dos profissionais da educação ‒ hoje, esse piso é de 60% e se restringe a professores. Outros 15%, ao menos, devem custear investimentos nas escolas. O dinheiro do Fundeb não poderá ser usado para pagar aposentadorias e pensões, como queria o governo federal.

Qualidade de ensino
Dos valores extras da União, 2,5% serão distribuídos às redes públicas que cumprirem requisitos de melhoria na gestão previstos em lei e atingirem indicadores de aprendizagem com redução das desigualdades, nos termos do sistema nacional de avaliação da educação básica. O texto prevê, no entanto, que isso começará a valer apenas em 2023, em valores correspondentes a 0,75%, percentagem que será progressivamente ampliada até atingir os 2,5% a partir de 2026. Nenhum ente federativo poderá reter os repasses vinculados ao Fundeb, sob pena de crime de responsabilidade.

Regulamentação
A lei que regulamentará o novo Fundeb deverá levar em conta as metas do plano nacional de educação; o valor anual por aluno investido em cada etapa e modalidade; a transparência e o controle social dos fundos; e o conteúdo e a periodicidade da avaliação dos indicadores de qualidade. Esse regulamento definirá ponderações relativas ao nível socioeconômico dos estudantes e à disponibilidade de recursos vinculados à educação e o potencial de arrecadação de cada ente federativo. Quanto ao padrão mínimo de qualidade do ensino, a referência será o custo aluno - qualidade, constante no Plano Nacional de Educação (Lei 13.005/14), com o objetivo de encontrar o financiamento necessário por estudante.

Dados centralizados
Com a finalidade de permitir a rastreabilidade e dar mais transparência pública ao uso do fundo, o texto que seguiu para o Senado determina a centralização dos dados contábeis, orçamentários e fiscais da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. 

Reforma tributária
O texto prevê uma salvaguarda em caso de reforma tributária: deverá ser assegurada, em cada exercício financeiro, a aplicação dos montantes mínimos em educação por estados, municípios e União equivalentes à média aritmética dos últimos três anos, independentemente de alterações nos tributos.

Da Redação da Aduff
Por Hélcio Lourenço Filho
(com dados e parte dos conteúdos a Redação do Andes-SN e da Agência Câmara

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