Jun
30
2020

Após currículo falso, cai mais um ministro da Educação de Bolsonaro

Não há como esperar bons ministros de um governo que ataca sistematicamente a educação pública, diz presidente da Aduff 

 

O presidente Jair Bolsonaro e o então ministro da Educação, Carlos Decotelli, logo após a nomeação O presidente Jair Bolsonaro e o então ministro da Educação, Carlos Decotelli, logo após a nomeação / Marcos Corrêa - Divulgação

DA REDAÇÃO DA ADUFF

O governo conhecido por desprezar a academia e a comunidade científica perdeu o seu terceiro ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli, após dados falsos no currículo de sua formação acadêmica serem revelados.

Substituto de Abraham Weintraub, Decotelli ficou apenas cinco dias no cargo até anunciar que 'pediu' demissão nesta terça-feira (30), menos de 24 horas após o presidente Jair Bolsonaro declarar apoio nas redes sociais e dizer que ele tem “capacidade para construir uma Educação inclusiva e de oportunidade para todos”. Mas o ministro não teria resistido a mais uma inconsistência em seu currículo: nota da Fundação Getúlio Vargas informa que ele não exerceu cargo de professor ou de pesquisador na instituição, como consta em seu currículo lançado na Plataforma Lattes. 

Curioso é que a FGV levou quatro dias para soltar essa nota, enquanto em bem menos tempo os reitores das universidades de Rosário, na Argentina, e de Wuppertal, na Alemanha, revelaram que ele não possuía, respectivamente, os títulos de doutorado e pós-doutorado como sustentava ter. Ao que parece, Decotelli atuava de forma precarizada na FGV, em eventuais cursos, sem contrato formal de trabalho. De todos os desmentidos a seu currículo, a nota da fundação foi a única contestada por ele - que a chamou de "fake" em entrevista à "CNN".

Também pesa sobre o agora ex-ministro a suspeita de plágio em seu mestrado. A FGV, onde cursou o mestrado, disse que uma comissão irá avaliar o caso e verificar as suspeitas de uso de trechos de outros autores sem autorização. A formação militar do breve ministro também foi alvo de questionamentos. Ele se apresenta como oficial da reserva da Marinha, mas na verdade pertence à categoria da reserva de Segunda Classe da Marinha ("RM2"), segundo revelou a colunista do "UOL" Thaís Oyama. Isto é, ingressou sem concurso para prestar lá um serviço militar temporário e muito curto.

'Governo contra a educação'

É o terceiro ministro a deixar a pasta em um ano e meio de governo. Antes de Weintraub, o cargo esteve por três meses nas mãos de Ricardo Vélez. Em comum entre os três, entre outros aspectos, a falta de relações com as universidades e a educação públicas e a adesão a um governo que trata a academia como inimigo a ser destruído.

Para a presidente da Aduff-SSind, professora Marina Tedesco, o mais grave no que ocorreu não é a ausência de títulos, mas a mentira. Ela demonstra o caráter de quem "escolheu se unir a um governo privatista, genocida, autoritário, que nega a ditadura e defende a tortura”, disse à reportagem da Aduff, antes de o ministro deixar o cargo. 

A docente lembra que não há como esperar bons ministros de um governo que ataca sistematicamente as comunidades acadêmicas e a educação pública. Ressalta ainda que a comunidade universitária precisa se preparar para enfrentar os projetos que ameaçam o setor e que estão sendo acelerados com a pandemia do coronavírus. Recentemente, o governo enviou ao Congresso Nacional o projeto "Future-se", que busca tirar a responsabilidade do Estado de financiar as instituições federais de ensino e facilitar a entrada de grupos empresariais privados no setor. Também sancionou lei que proíbe concursos públicos e congela salários de servidores por quase dois anos.

Cotados para o cargo

As pessoas cotadas para assumir a pasta não indicam mudanças de rumos nesse aspecto. Alguns jornais cogitam os nomes de Anderson Correia, atual reitor do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), Sérgio Sant'Ana, ex-assessor do Ministério da Educação, Antonio Freitas, conselheiro do CNE (Conselho Nacional de Educação) e pró-reitor na FGV, e Renato Feder, secretário de Educação do Paraná, conhecido por defender a privatização de toda a educação pública.

Nomeado sem chegar a assumir, Decotelli incluiu no seu currículo lattes prontamente o cargo de ministro, enquanto retirava as qualificações reveladas inverídicas. Ironicamente, mais uma informação que menos de cinco dias depois se revelaria também falsa.  

DA REDAÇÃO DA ADUFF
Por Hélcio Lourenço Filho

O presidente Jair Bolsonaro e o então ministro da Educação, Carlos Decotelli, logo após a nomeação O presidente Jair Bolsonaro e o então ministro da Educação, Carlos Decotelli, logo após a nomeação / Marcos Corrêa - Divulgação