Jun
26
2020

Nota da Diretoria da Aduff-SSind

Toda a comunidade acadêmica da UFF deve permanecer em estado de alerta para que o discurso do “emergencial” não se transforme em regra!

Toda a comunidade acadêmica da UFF deve permanecer em estado de alerta para que o discurso do “emergencial” não se transforme em regra!

A crise sanitária que se abate sobre o mundo e sobre o Brasil vem exigindo de todos nós – docentes, discentes e técnico-administrativos da Universidade Federal Fluminense – cuidados específicos para a proteção de nossas vidas e de nossos familiares. As medidas de isolamento continuam, até o momento, sendo a única forma de proteção frente à crise pandêmica que ainda se encontra em sua curva ascendente no Brasil. A política de flexibilização adotada pelo governo do Estado do Rio, no início de junho, rompeu com as medidas da quarentena, necessárias ao controle do novo coronavírus, colocando a vida do trabalhador em risco. No entanto, isso não causa quaisquer constrangimentos àqueles que estão no poder. Dados divulgados pelo jornal “O Globo”, em 24 de junho, demonstram que o Estado do Rio já ultrapassou os 100 mil casos confirmados da doença, com mais de 6.000 mortes apenas na capital.

Frente a este quadro tenebroso, que ameaça a vida da classe trabalhadora, a reitoria da UFF opta por processos aligeirados e que não contemplam a discussão em todas as instâncias da comunidade acadêmica. Com isso, desnuda sua concepção de educação e de universidade. Foi assim que, no último dia 12 de junho, o CEPEX aprovou a Resolução n.º 156/2020. Sem qualquer discussão no Conselho Universitário, que tem entre suas atribuições “orientar a política educacional da Universidade dentro dos princípios e normas gerais da legislação competente”, sem ampla divulgação da minuta para a comunidade acadêmica e com menos 5 dias úteis para discussão antes da votação – as minutas para extensão e para a pós-graduação tiveram menos de 48 horas de discussão.

A citada Resolução n.º 156/2020 trata dos critérios para o planejamento e para a execução das denominadas “Atividades Acadêmicas Emergenciais (ACE)”. Além disso, define o perfil do discente “concluinte/provável formando”, para efeito do regime do Período Letivo Especial. Segundo a resolução, as ACE constituem um mecanismo para que o estudante consiga concluir seu curso, transferindo para o ambiente domiciliar a realização e a conclusão de disciplinas mediadas pelo uso de tecnologias digitais.

Ao ser aprovada tal resolução, que além de todos os problemas já elencados não foi embasada em nenhum levantamento sobre as condições socioeconômicas, psicossociais e de acesso de docentes e discentes, a mesma se torna um instrumento não científico e perigoso. Travestida de direitos concedidos aos estudantes, a Resolução N.º 156/2020, de fato, cria condições propícias a um processo de diferenciação entre estudantes da UFF, dentro do mesmo curso e/ou da mesma disciplina.

Tal diferenciação, ainda que em menor grau, não poupa o corpo docente. É fato que, inúmeras vezes, professores têm se encontrado em precárias condições de acesso às ferramentas tecnológicas, enfrentando dificuldades de acesso ao sinal de internet. Tudo isso, destacamos, também se apresentará como um dos empecilhos ao nosso trabalho, ao se tornar refém dessa nova lógica orientada por “atividades em ambiente remoto”.

Em parte dos departamentos da UFF, apenas nesta semana foram iniciadas as rodadas de reuniões para as discussões sobre esta resolução e os meios para sua execução. E os problemas levantados ao longo desta semana já começam a aparecer: obrigatoriedade de planejamento sem informações sobre os estudantes, falta de apoio pedagógico ancorado em pesquisas e estudos sobre ensino através de uso de tecnologias digitais (que não é a área de pesquisa da imensa maioria dos docentes), responsabilização dos professores por traçar estratégias contra a falta de acesso estudantil, que se configura em um constrangimento e na exigência de dar conta de uma demanda que vai muito além da alçada docente, entre outros.

Sem qualquer garantia de que estaremos oferecendo uma formação de qualidade aos nossos alunos, o planejamento das ACE será enviado, pela Direção de cada Unidade Acadêmica, para a Pró-Reitoria de Graduação até 26 de junho de 2020. O tempo exíguo levou os docentes a preparar seus respectivos planejamentos de forma acelerada. Portanto, ao contrário do que afirma, as atitudes da Reitoria – ao limitar as decisões que deveriam ser tomadas como resultado de ampla discussão – vêm negando o seu “compromisso institucional” junto à formação acadêmica de qualidade e à produção e socialização do conhecimento.

As medidas desta resolução já se encontram em processo de implementação e muitos de nós já as adotamos, sem que houvesse um período necessário para sua análise, bem como sobre suas implicações presentes e futuras. No entanto, este processo deverá ser tomado por todos nós como um alerta em tempos nos quais, em nome da pandemia, tudo e todas as coisas ganham o adjetivo de “emergencial”. Ainda que tenhamos, neste momento, nos “adaptado” aos parâmetros desta resolução, tal decisão, no entanto, não deverá nos conduzir à adoção do mesmo caminho junto às demais disciplinas presenciais que compõem os currículos dos nossos cursos.

Nesse sentido, precisamos estar atentos às novidades que já se avizinham como, por exemplo, a Portaria do MEC, Nº 544, de 16 de junho de 2020 que, ao assumir a lógica da flexibilização do ensino, acompanhada de suas metodologias ativas, autoriza a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais enquanto durar a situação de pandemia do novo coronavírus, sendo este período estendido até 31/12/2020. A flexibilização das atividades práticas profissionais na forma de estágios ou práticas que exijam laboratórios especializados também estão contempladas nesta portaria, desde que sigam os princípios das Diretrizes Curriculares de cada curso e de seus PPC.

Camuflada pelo conceito de responsabilidade e liberdade institucional a portaria afirma em seu Art. 1º, § 2º: “Será de responsabilidade das instituições a definição dos componentes curriculares que serão substituídos, a disponibilização de recursos aos alunos que permitam o acompanhamento das atividades letivas ofertadas, bem como a realização de avaliações durante o período da autorização de que trata o caput.” (DOU, PORTARIA Nº 544, DE 16 DE JUNHO DE 2020).

Na mesma direção, o plano de atividades para a implementação da Resolução N.º 156/2020 joga esta obrigação governamental e institucional sobre os ombros docentes. Aliás, esse é um tema urgente a ser tratado pelo CUV, estranhamente ainda não convocado para deliberar sobre essas e outras questões urgentes, o que certamente contribui para esse processo açodado, já comprometido pela falta de debate institucional suficiente para amenizar os efeitos da exclusão causada por fatores sanitários, sociais e econômicos.

É preciso que a comunidade acadêmica avalie e siga avaliando as consequências desta e de outras resoluções deliberadas no CEPEX sem qualquer decisão do CUV. Estão em jogo a formação dos discentes e a atuação destes egressos durante décadas na sociedade, as condições de trabalho de docentes e técnico-administrativos e a própria universidade pública. A pandemia não pode ser justificativa para a substituição do ensino de qualidade pela certificação, para a falta de democracia, para o avanço da EAD e do ensino remoto dentro das instituições de ensino superior, para a captura de nossas informações por grandes corporações e para que a universidade passe a adotar práticas não científicas na medida em que não estão sustentadas por nenhuma pesquisa. O chamado “novo normal” do jeito que vem sendo construído não tem data para acabar, e sem dúvida nenhuma pretende conformar uma nova concepção permanente de universidade pública que não é gratuita, de qualidade, democrática, interiorizada, laica e socialmente referenciada. Contra isso, é fundamental estarmos organizados!

Gestão "ADUFF Autônoma, Democrática e de Luta"
Biênio 2018/2020

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