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Jun
11
2020

Ato em Niterói critica racismo estrutural na sociedade brasileira

"Racismo estrutural da sociedade deve ser combatido frontalmente para impedir a violência cotidiana contra negras e negros e o ascenso do neofascismo", disse diretor da Aduff-SSind 

O I Ato Antirracista de Niterói aconteceu nesta quinta-feira 11 de junho, partindo da Estação das Barcas, no Centro. Percorreu outras ruas da cidade, como a Avenida Amaral Peixoto, e foi até a Câmara Municipal. Contou com a participação de representantes de diversas frentes dos movimentos negros do município e de partidos de esquerda, que empunhavam cartazes com palavras de ordem. Entre elas: "Vidas Negras Importam!" e "Vidas Negras Faveladas Importam". Outros cartazes, nomes e idades de pessoas negras que foram assassinadas em decorrência da ação estatal. Houve críticas também à flexibilização do isolamento social na cidade, neste contexto de pandemia da Covid-19, que, como afirmam os infectologistas, ainda não atingiu o ápice dos contágios no país e se mostra ainda mais dramático para a população negra. 

A Aduff-SSind participou da articulação dessa manifestação, por meio do Fórum Sindical e Popular de Niterói, que reúne os sindicatos e parte desses movimentos sociais. 

Cerca de cem agentes do 12º Batalhão da Polícia Militar de Niterói e da RECOM (Rondas Especiais e Controle de Multidões) estiveram concentrados em frente a Estação das Barcas e nas cercanias, revistando a mochila dos pedestres e dos participantes no ato. Helicóptero da polícia sobrevoou algumas ruas do Centro, próximas ao Shopping, e houve também policiais em motos. 

A luta antirracista deve ser permanente, mas tem ganhado visibilidade em diversos países depois de um homem negro, George Floyd, ter sido abordado de forma agressiva e covardemente asfixiado pela polícia de Minneapolis (EUA), no dia 25 de maio deste ano. É fato que as questões de desigualdade sócio-econômicas estão pautadas por questões raciais e Niterói, como qualquer outra parte do mundo, não foge à regra.

De acordo com Reginaldo Costa, professor da Faculdade de Educação da UFF e diretor da Aduff, as mobilizações têm mostrando que o racismo estrutural da sociedade deve ser combatido frontalmente, para impedir a violência cotidiana contra negras e negros e o ascenso do neofascismo. "Sem dúvida foi uma inspiração ver os atos do povo negro nos EUA, Inglaterra, assim como as manifestações antifascistas das torcidas organizadas no Brasil, em São Paulo. Não vamos sair dessa crise capitalista, da pandemia e superar o racismo sem que haja mobilização contundente das trabalhadoras e trabalhadores", disse o docente.

Reginaldo Costa também criticou a conduta do governo perante a pandemia, marcada pelo negacionismo científico, autoritarismo e completo desprezo pela vida dos trabalhadores. “Quem mais sofre na linha de frente do combate ao Coronavírus são mulheres, negras e negros, enquanto profissionais de saúde e trabalhadores mais precarizados, que não têm a possibilidade do isolamento social, acesso à saúde pública de qualidade e sofrem o peso do desemprego, subemprego e o baixo salário”, afirmou.

O professor lembrou que nas favelas e nas periferias tais condições adquirem uma profundidade ainda mais dramática, como a subnotificação de casos, o escasso saneamento básico, a ausência de testes e de atendimento médico. “E são negras e negros os mais atingidos. Vamos dialogar com a sociedade civil sobre todo este caos que estamos vivendo e as reais alternativas para a superação do genocídio contra o povo negro”, disse. “Vamos lutar pelas nossas vidas. Vamos resistir em defesa das liberdades democráticas, por um sistema de saúde público de qualidade e por uma segurança pública que não nos considere bandidos pela cor da nossa pele. Esta luta é justa, urgente é uma demonstração de esperança na humanidade”, complementou.

Para Benny Briolly, mulher negra trans, favelada, ativista LGBTI+, de negritude e de direitos humanos, a pandemia da Covid-19 trouxe ainda mais dificuldades para os moradores de periferia. “Estamos esperando esse isolamento social chegar na periferia até hoje. Isso porque quem pode, tem ficado em casa, mas nas favelas, onde não chegam políticas de assistência e onde existem muitos trabalhadores que exercem atividades essenciais, isso não tem sido garantido com política pública de verdade”, explica.

De acordo com ela, não é possível fingir que o isolamento social está ocorrendo de fato enquanto o povo negro e periférico morre triplamente. “Morremos mais por Covid-19 porque é o povo negro (40%) e indígena (48%) que são os que mais têm risco de morte após a hospitalização por Coronavírus. É também o nosso povo que mais depende de políticas sanitárias contra a contaminação pela falta de saneamento e distribuição de água nas favelas. Morremos duplamente porque as operações policiais não pararam com o isolamento social e o genocídio negro no Brasil nos leva 30 mil jovens por ano, 77% de negros. E morremos triplamente porque sem política de assistência em época de crise sanitária, a fome nos chega como um agravante. Assistimos a essa tripla morte fingindo que estamos em iguais condições do que os setores da branquitude e da classe média? Ou vamos às ruas arriscando às nossas vidas e de nossos familiares para dar visibilidade a essa política genocida?”, pergunta a ativista.

Da Redação da ADUFF
Por Aline Pereira 
Fotos: Clever Felix/ LDG News