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Jan
28
2020

Docentes reagem aos cortes no orçamento e à nomeação do novo presidente da Capes

Instituição de pesquisa contará com metade do orçamento previsto para 2020; gestor defende criacionismo e 'design inteligente'

Evangélico e criacionista, Benedito Guimarães é o novo presidente da Capes Evangélico e criacionista, Benedito Guimarães é o novo presidente da Capes / DIVULGAÇÃO/MACKENZIE

O docente Benedito Guimarães Aguiar Neto, defensor do criacionismo, foi nomeado pelo governo Bolsonaro à presidência da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Capes, vinculada ao Ministério da Educação, que contará, em 2020, com R$2,2 bilhões - metade do orçamento do ano anterior, que era de R$4,5 bilhões.  

A nomeação de Benedito e a redução de 50% no orçamento já contingenciado do órgão de fomento causaram reação entre os acadêmicos. Uma das importantes instituições de estímulo à pesquisa do país, responsável pela concessão de bolsas de pesquisa e avaliação de cursos de pós-graduação, tem sido esvaziada em sua importância, seja na aplicação de recursos ou no viés que deve conduzir a administração da entidade.

Não obstante a “política de estrangulamento”, a Capes terá à frente alguém que nega a teoria da evolução explicada por Charles Darwin há mais de 160 anos. Evangélico, Benedito Guimarães crê na teoria do 'design inteligente', que sustenta que Eva teve origem a partir da costela de Adão.

"É inadmissível o tipo de política que o governo tem empreendido para a ‘Ciência e Tecnologia’ no país; primeiro ao enxugar o orçamento da Capes pela metade; orçamento este que já tinha sido contingenciado em R$300 milhões no ano passado. É ainda tão inadmissível que o novo presidente da Capes, órgão fundamental para o financiamento das pesquisas brasileiras (realizada em sua grande maioria em instituições públicas), defenda posições como o criacionismo, que só tem base religiosa, e não científica. Trata-se de mais uma prova que não há nada de técnico nesse governo, que tem como projeto submeter a pesquisa brasileira às suas crenças e colocar a educação pública a serviço do capital", afirma Marina Tedesco, presidente da Aduff.

De acordo com a docente, a medida também é uma sinalização do governo a dois setores que o apoiam, como a bancada evangélica e o ensino superior privado, lembrando que Benedito Guimarães é ex-reitor Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), cargo que ocupou entre os anos de 2011 e 2019. Na Mackenzie, os alunos contam com um centro de "ciência, fé e sociedade" para debater o ‘design inteligente’.

“As pessoas são livres (ou deveriam ser) para professar a fé que quiserem. Entretanto, não é possível aceitar que um representante do Estado e que um presidente de uma agência de fomento à pesquisa se posicionem conforme os dogmas de uma dada religião”, critica a presidente da Aduff, para quem é preciso garantir a laicidade das ações estatais no âmbito da ciência, do ensino e das políticas públicas, por exemplo. "Temos que estar atentos para exigir respeito aos métodos científicos e resistir ao processo de desmonte da pesquisa, da educação públicas", complementou Marina Tedesco.

Proselitismo

Pesquisadores do Núcleo de Apoio à Pesquisa em Educação, Divulgação e Epistemologia da Evolução "Charles Darwin" (NAP Edevo-Darwin), da Universidade de São Paulo - USP, também criticaram em nota pública, no dia 24 de janeiro, a nomeação e as declarações de Benedito Guimarães Aguiar Neto à frente da Capes.

De acordo com o documento do NAP Edevo-Darwin, "criacionismo científico" não é reconhecido por nenhuma comunidade científica mundial. Assim como o 'design inteligente', ambas as expressões têm sido difundidas pelo 'cinturão evangélico' dos Estados Unidos para que sejam difundidas nos currículos escolares. "O ensino religioso é permitido no Brasil, mas deve ser restrito à disciplina de ensino religioso, que não é de frequência obrigatória, e não pode incluir proselitismo religioso (Lei 9394/1996, artigo 33)", adverte a nota.  

Para os mesmos pesquisadores, a defesa de dogmas religiosos retrógrados e as tentativas de impor aos jovens aulas que apontem para temas ligados diretamente a uma dada concepção de religião ferem a Constituição e condenam gerações ao atraso. “Condenará a juventude do país a não compreender questões científicas básicas acerca da vida no planeta, como a origem e a importância da conservação da biodiversidade, o desenvolvimento de resistência a antibióticos por parte de certas bactérias, e tantas outras questões que o mundo moderno veio a entender graças à teoria da evolução”.

Da Redação da Aduff
Por Aline Pereira
Foto: Divulgação 

Evangélico e criacionista, Benedito Guimarães é o novo presidente da Capes Evangélico e criacionista, Benedito Guimarães é o novo presidente da Capes / DIVULGAÇÃO/MACKENZIE

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