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Set
06
2018

“BNCC está pavimentando caminho muito perigoso”, diz Marcos Barreto

Atividade promovida pela Direção e GTPFS da Aduff-SSind contou também com a participação do professor Fernando Penna – ambos os docentes da Faculdade de Educação demonstraram as articulações entre a concepção de trabalho a partir do viés neoliberal, a BNCC e a reforma do ensino médio

Da Redação da ADUFF
Por Aline Pereira
Foto: Luiz Fernando Nabuco/Aduff-SSind

 

"Base Nacional Comum Curricular (BNCC): um projeto de governo ou projeto de Estado?" - esse foi tema da atividade organizada pela Diretoria e o Grupo de Trabalho em Política de Formação Sindical (GTPFS) da Aduff-SSind, realizada no Campus do Gragoatá na tarde de quarta-feira (5). Os docentes Fernando Penna e Marcos Barreto - ambos da Faculdade de Educação da UFF - demonstraram ao público as articulações entre a concepção de trabalho a partir do viés neoliberal, a BNCC e a reforma do ensino médio.

Em referência à recente declaração de Michel Temer, que afirmou que o "Brasil voltou 20 anos em dois", Fernando Penna enfatizou que a política educacional em curso é muito parecida com as propostas do governo de Fernando Henrique Cardoso - privatistas e tomada por concepções empresariais - politicas de responsabilização quando não se alcançar as metas estipuladas, avaliação do docente, precarização da profissão e do processo de aprendizagem.    

O docente criticou a Medida Provisória 746, que deu origem à lei 13415/17, alterando a Lei de Diretrizes e Bases - LDB (9394/96) e instituindo a Reforma do Ensino Médio. Citou o fato de a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão ter chamado atenção para a celeridade com a qual o governo empreendeu tal mudança na Educação, sem debater com a sociedade e de forma autoritária.

A Reforma do Ensino Médio tem que ser pensada no contexto em que se instituiu a BNCC - modificação substantiva no currículo dos estudantes, que depois de concluírem a metade desse ciclo poderão optar por dar ênfase a um dos cinco 'itinerários formativos', a saber: linguagens e suas tecnologias; matemática e suas tecnologias; ciências da natureza e suas tecnologias; ciências humanas e sociais aplicadas; formação técnica e profissional.

Entretanto, Penna adverte que as escolas estão desobrigadas de oferecer todos os itinerários – o que na prática significa dizer que o foco estará no ensino de Português e Matemática em detrimento de disciplinas como Artes, Educação Física, Sociologia, Filosofia, Química, Física, História e Geografia - que podem ter seu tempo reduzido ou sequer ser ofertadas aos estudantes.

Segundo Penna, tal fato irá aprofundar ainda mais as desigualdades entre os estudantes do país, pois tanto a Reforma do Ensino Médio quanto à BNCC desconsideram as regionalidades e as especificidades de estados e municípios. "Haverá aumento da segregação social, pois a escola de elite poderá adaptar o currículo sem grandes mudanças - enquanto em alguns municípios do Brasil há apenas uma escola pública que poderá oferecer um ou dois itinerários", disse Penna, afirmando que "acabou a possibilidade de escolha” para o aluno sem recursos financeiros.

“Querem que nos acostumar aos recursos escassos”, disse Marcos Barreto

“O mesmo governo que oferece esse receituário de Educação é também o que nos condena a 20 anos de contenção de gastos públicos, alcançando uma geração inteira”, disse Marcos Barreto ao criticar os efeitos da Emenda Constitucional 95 – a do teto dos gastos públicos. Para o docente, há clara tentativa de fazer com que a população se “acostume” com recursos escassos e que saiam em busca de novas fontes de financiamento – como os da iniciativa privada, o que, na prática, levaria ao fim da Educação Pública. “A agenda científica do país tem sido posta como negócio no setor privado com rapidez e intensidade assustadoras”, afirmou.

De acordo com Barreto, a agenda dos anos 90 tem avançado de forma insidiosa no Brasil. Ele refere-se à década em que a implementação de políticas neoliberais em países da América do Sul tornaram-se cada vez mais expressivas por meio de programas de privatização, de estratégias de desinvestimento na Educação Pública. “As noções de direitos sociais têm se tornado mercadorias; perdas mais significativas estão mesmo no plano filosófico – não há mais preocupação com plano emprego”, disse.  

Segundo o docente, uma escola privada em Niterói reduziu o tempo de disciplina de História para oferecer, como contrapartida, aulas de Introdução à Economia, evidenciando que está em curso um processo de esvaziamento da dimensão política da Educação. “Tornou-se um nicho de mercado e não mais um direito”, afirmou Marcos Barreto afirmando que juntamente com esse processo tem ocorrido a desqualificação da figura do professor e do servidor público.

Não à toa, como disseram os palestrantes, a BNCC permite que um profissional “notório saber” possa desempenhar a atividade de docência, precarizando ainda mais a função do professor e esvaziando, consequentemente, as Licenciaturas. “A BNCC está pavimentando um caminho muito perigoso. Nossa estratégia de combate deve ser a desobediência. É preciso estabelecer alianças com as escolas públicas e com os professores do ensino médio e fundamental, pois ainda estamos muito apartados deles e isso é injustificável”, ponderou o palestrante.

A professora Marina Tedesco, docente do curso de Cinema da UFF e presidente da Aduff-SSind, avaliou a atividade positivamente e considerou oportunas as considerações dos professores. “Os ataques que começam na escola pública nos afetam na Universidade. Precisamos nos munir de argumentos, dialogar para fora dos muros e construir esse entendimento, promovendo outras atividades de formação que nos movam nessa direção”, disse ao final do debate.  

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