Jul
21
2017

Em Campos, período de férias traz incertezas quanto ao retorno de estudantes para segundo semestre

No 62° Conad, os docentes aprovaram resolução na qual apontam a necessidade de o Andes-SN e as seções sindicais atuarem de forma conjunta com os estudantes na busca de soluções para os problemas na política de assistência e permanência estudantil 

Pressão dos estudantes levou reitor a Campos, onde se reuniu com comunidade acadêmica Pressão dos estudantes levou reitor a Campos, onde se reuniu com comunidade acadêmica / Matheus Thomaz
Pressão dos estudantes levou reitor a Campos/ Foto: Matheus Thomaz

DA REDAÇÃO DA ADUFF

O primeiro semestre letivo de 2017 na UFF chegou ao fim na quinta (20), mas muitos estudantes da Universidade Federal Fluminense vão voltar para suas casas, nas férias, com dúvida se conseguirão retornar à instituição e concluir o próximo semestre de aulas. Diante do número insuficiente de bolsas e auxílios estudantis, consequência de uma política de assistência e permanência estudantil que ficou aquém da expansão operada na universidade, o aumento da evasão é uma realidade cada vez mais pungente na UFF, principalmente nos campi do interior, que, em regra, não contam com moradia estudantil e restaurante universitário. Este é o caso da UFF de Campos dos Goytacazes.

De acordo com dados do Sistema de Transparência da UFF, no processo seletivo realizado pela Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (Proaes) para concessão de bolsas de assistência e auxílios no primeiro semestre deste ano, 1.172 pedidos vieram de estudantes da UFF de Campos, mas apenas 577 destes foram contemplados, deixando um contingente grande de estudantes – com perfil para o benefício –de fora. As bolsas e auxílios de assistência estudantil são a única alternativa para a conclusão da graduação para muitos estudantes, principalmente para os cotistas. Elas atendem especificamente estudantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica, desempregados e que não foram contemplados com nenhuma outra bolsa.

“Com a diminuição da renda per capita num momento de crise e desemprego como o que estamos passando no Brasil, muitos estudantes estão em dificuldade sem as bolsas, já que a oferta na UFF não acompanhou o crescimento da demanda. Diante da iminência do aumento das evasões por falta de condições financeiras, reivindicamos o aumento no número de bolsas no edital do segundo semestre de 2017 e, enquanto isso, o aumento de bolsas emergenciais para os que não foram contemplados", ressalta a estudante Joice Carvalho Silva, do 7° período do curso de Ciências Sociais da UFF de Campos, que compõe a atual gestão do DCE.

Maria Eduarda Pereira Pinto, 4°período de Ciências Sociais e integrante do Coletivo Negro Mercedes Baptista, conta que a grande maioria dos integrantes do coletivo ficou sem bolsa no primeiro semestre. “Muitos estudantes que não foram contemplados neste edital, a maioria cotistas negros e negras – e consequentemente pobres, por conta da estrutura histórica do país – sempre receberam as bolsas. Essa situação inviabiliza nossa permanência na universidade”. Ela problematiza ainda a falta de transparência no processo de concessão dos benefícios e a falta de autonomia da Proas de Campos.

“Pedimos uma reunião com as assistentes sociais da UFF de Campos para discutir o que achávamos ser arbitrariedades no processo de concessão de bolsas e nas entrevistas – uns são chamados para entrevista, outros não – e as profissionais alegaram falta de autonomia em relação à Niterói. Saímos da reunião com as nossas demandas, mais as delas. Recorrer à Niterói é muito difícil, a gente manda email e eles não respondem, tentamos ligar e eles não atendem. O diálogo é muito complicado e as assistentes sociais daqui ficam de mãos atadas", conta.

O Coletivo Negro Mercedes Baptista formulou um questionário online para os estudantes de Campos responderem. De acordo com Maria Eduarda, os dados deste questionário mostraram que metade dos cotistas, quando não evadem, têm problema com bolsas. “Passamos o primeiro semestre promovendo arrecadação de alimentos, distribuindo cestas básicas e realizando um levantamento dos alunos que não receberam bolsa, em parceria com os centros acadêmicos, para ajudarmos uns aos outros e alcançar a demanda de alunos que a universidade não tem pretensão de alcançar", relata.

O valor da bolsa de desenvolvimento acadêmico é de 440 reais e não é reajustado desde 2010. O auxílio moradia é de R$300 e o de alimentação foi reduzido de 250 para 145 reais, no ano passado. Dados do Fórum Nacional de Pró-Reitores de Planejamento e de Administração das Instituições Federais de Ensino Superior (FORPLAD) davam conta que a taxa de evasão anual média da UFF, entre 2010 e 2014, era de aproximadamente 20%, o que significava que, a cada ano, um em cada cinco estudantes da UFF abandonavam seus cursos.  É provável que agora este número tenha crescido.

Auxílios e comprovação

Como se não bastasse a dificuldade para ser contemplado por uma bolsa, os estudantes também reclamam do processo burocrático para emissão de comprovantes dos gastos com os auxílios. “No caso do auxílio-alimentação, a Proaes só aceita lugares que servem comida pronta e tenham CNPJ para comprovar um valor de apenas 145 reais, totalmente insuficiente para alimentação dessa forma, durante todo o mês”, critica Joice.

Ela conta que a maioria dos estudantes faz compras no supermercado com o valor do auxílio. Em relação ao auxílio-moradia, a Proaes estabelece que o comprovante de pagamento de aluguel tenha que estar no nome do aluno, exigência que, segundo o movimento estudantil, desconsidera a realidade de estudantes que moram, em sua maioria, em repúblicas, com pouco acesso a documentação formal. Os estudantes reivindicam formas mais simples e menos burocratizadas de prestação de contas.

SPA e Saúde mental

As estudantes também enfatizam que a pressão acadêmica aliada às dificuldades financeiras está aumentando o número de problemas relacionados à saúde mental entre os discentes de Campos. “O pessoal fica bem mal. Ou sai porque não tem dinheiro para continuar, ou repete, não consegue levar, vai ficando para trás. A universidade que nunca esteve atenta para isso foi obrigada a reparar que os estudantes estão com problema de saúde mental”, ressalta Maria Eduarda. Na turma dela, conta, dos 35 estudantes que começaram o 1° período de Ciências Sociais, menos de dez chegaram ao 4°. Os que não desistiram, estão desperiodizados.

Ainda assim, mesmo apresentando laudos médicos, os estudantes não conseguem trancar as disciplinas para tentar evitar a reprovação. “Queremos ter garantido o trancamento de disciplinas no decorrer de todo o período letivo, para casos comprovados ligados à saúde mental dos estudantes”, explica Joice. Os estudantes também exigem da administração da UFF que sejam tomadas as medidas necessárias para a manutenção e ampliação dos serviços do SPA (Serviço de Psicologia Aplicada), que atende não só aos estudantes, mas à comunidade de Campos em geral e, atualmente, não consegue atender a demanda de consultas, por falta de infraestrutura e funcionários.

Mobilização estudantil e visita do Reitor

Diante do quadro, o Coletivo Negro Mercedes Baptista iniciou uma série de reuniões e mobilizações em Campos que culminou, no final de maio, na ida de dois ônibus de estudantes à reunião do Conselho Universitário da UFF (CUV). Em Niterói, eles cobraram respostas da administração central da Universidade e do reitor Sidney Mello sobre a política de concessão de bolsas e auxílios de assistência estudantil na UFF e conseguiram que o reitor se comprometesse a visitar a universidade em Campos, o que aconteceu no dia 4 de julho.  A pauta da reunião com Sidney foi elaborada em assembleia geral extraordinária, convocada pelos estudantes.

Em Campos, o reitor disse que não houve corte nas bolsas de assistência estudantil, mas aumento da demanda na universidade e não fez menção em aumentar o número de bolsas para o próximo período. Afirmou que iria tornar públicos os critérios para seleção e distribuição de bolsas e auxílios e dialogar com as instâncias da Universidade para tentar garantir o trancamento de disciplinas, durante todo o período letivo, mediante a apresentação de laudos médicos. Sobre o SPA, não apresentou proposta para a melhoria das condições precárias das instalações do prédio, em Campos, e disse que não há perspectivas para novas contratações. O Pró-Reitor Leonardo Vargas, da Proaes, que também participou da reunião, assumiu o compromisso com os estudantes de garantir que notas fiscais de supermercado possam ser utilizadas como comprovantes para prestação de contas do auxílio-alimentação.

Ao final da reunião, estudantes que integram a nova gestão do DCE apresentaram para o reitor Sidney Mello uma lista com as pautas que o próprio teria garantido cumprir durante a reunião, mas de acordo com eles, o reitor se recusou a comprometer-se formalmente, assinando uma carta afirmando 'estar ciente' das pautas e demandas estudantis.

“Ele disse que comprometimento era uma palavra muito forte, que era um acordo coletivo. Prometeu voltar em duas semanas para realizar uma reunião com o prefeito da cidade, Rafael Diniz (PPS), debater com o município o passe-livre para os estudantes da UFF de Campos e negociar que um galpão abandonado ao lado do campus seja transformado em um espaço cultural permanente da universidade”, conta Joyce.

Incertezas e intensificação das mobilizações

A estudante Clara Figueiredo, que também compõe a diretoria do DCE em Campos dos Goytacazes, friza que a reunião entre o reitor e o prefeito da cidade ainda não aconteceu. “É ruim porque se essa reunião for realizada durante o período das férias, os estudantes não vão conseguir se mobilizar para participar. Muitos já voltaram para suas casas, até como uma forma de economizar dinheiro. A maioria dos estudantes da UFF de Campos não é daqui. Não temos garantias de nada, o clima para o segundo semestre é de incerteza. A única certeza é que as mobilizações dos estudantes deverão continuar”, ressalta.

Para o professor do curso de Serviço Social da UFF de Campos e integrante do Conselho de Representantes da Adufff-SSind, Matheus Thomaz, a perspectiva para o segundo semestre letivo de 2017 é de dificuldade. “Vamos voltar às aulas com as dificuldades de sempre, faltando coisas, dando aula em contêineres. Quando o reitor veio a Campos, sinalizou algumas mudanças administrativas, mas estruturalmente não muda nada. Continuamos sem previsão para a conclusão do prédio do campus novo, por exemplo. Os professores têm que estar junto dos alunos, acompanhando e apoiando a luta deles e vendo formas de a gente construir mobilizações conjuntas”, encerra.

No 62° Conad, realizado entre os dias 13 e 16 de julho, em Niterói, os docentes aprovaram resolução na qual apontam a necessidade de o Andes-SN e as seções sindicais atuarem de forma conjunta com os estudantes e técnicos-administrativos na busca de soluções para o problema da assistência estudantil e os possíveis efeitos dos cortes e reduções de bolsa e o seu papel no quadro de adoecimento estudantil, uma situação em que, avaliaram, também interfere diretamente no trabalho docente. 

 DA REDAÇÃO DA ADUFF/ Por Lara Abib

Pressão dos estudantes levou reitor a Campos, onde se reuniu com comunidade acadêmica Pressão dos estudantes levou reitor a Campos, onde se reuniu com comunidade acadêmica / Matheus Thomaz

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