Mai
06
2025

Regional RJ do Andes-SN reúne docentes para discutir luta por Memória, Justiça e Reparação

Debate fez parte do Encontro Pós-43º Congresso do Andes-SN, realizado na última quarta-feira (30), no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS-UFRJ). Evento reuniu docentes de várias instituições de ensino do estado do Rio de Janeiro. Professores da UFF estiveram presentes

Regional RJ do Andes-SN reúne docentes para discutir luta por Memória, Justiça e Reparação / Bruno Marinoni | Adunirio

"Por memória, justiça e reparação, no campo e na cidade: lutar não é crime" foi o tema central da mesa realizada pela Regional RJ do Andes-SN na última quarta-feira (30), como parte do Encontro Pós 43º Congresso do Andes-SN.

Na mesa de abertura, o professor Cláudio Ribeiro (UFRJ), um dos coordenadores da Comissão da Verdade do Sindicato Nacional, debateu os desafios do funcionamento desta comissão e do Grupo de Trabalho de História do Movimento Docente (GTHMD), apresentando as principais resoluções sobre o tema, aprovadas no 43º Congresso.

Na atividade, realizada no contexto de descomemoração do golpe empresarial-militar de 1964, Ribeiro ainda fez questão de lembrar que durante aquela semana, no dia 28 de abril de 2025, completou-se 55 anos do primeiro grande expurgo de docentes, promovido pela ditadura empresarial militar, nas universidades brasileiras.

A prática era caracterizada pela remoção forçada, geralmente sem o processo devido, de professores de instituições de ensino superior, com o intuito de silenciar e eliminar da comunidade acadêmica aqueles e aquelas que eram críticos ao regime ditatorial.

Em sua fala, Cláudio relatou os esforços do Andes-SN para unificar uma metodologia de trabalho, assim como um sistema de registro, catalogação e arquivamento das Comissões da Verdade das seções sindicais do Andes. E defendeu a importância de vê-las funcionando de forma complementar ao trabalho das Comissões da Verdade das instituições de ensino.

“Cada vez mais a gente percebe como a herança autoritária ainda fala muito alto e como a gente sempre esbarra nela nas nossas universidades. Por exemplo, um debate que eu tenho feito agora, sobre a curricularização da extensão na UFRJ, está incidindo diretamente num debate de trabalho gratuito de estudantes em troca de créditos de disciplinas. E uma das que questões que fomenta isso é exatamente a organização das disciplinas em forma de crédito, nesse formato que vem de uma herança da interferência da ditadura militar nas universidades”, alertou.

Ribeiro também destacou que o 43° Congresso aprovou a entrada do Andes-SN na “Coalizão Brasil por Memória, Verdade, Justiça, Reparação e Democracia” – iniciativa inédita que reúne mais de 150 organizações, que se dedicam à luta pela memória, verdade, justiça e reparação das distintas formas de violências do Estado. Para Cláudio, a Coalização dá amplitude tática ao enfrentamento da realidade e coloca a pauta como centralidade, de uma maneira bastante crítica. “A gente aprovou a entrada na Coalização como ação importante de ampliação e de renovação desse debate”, frisou.

Presente na atividade, a diretora da Aduff-SSind, Adriana Barbosa, afirmou a importância dos encontros regionais do Andes-SN para o diálogo e reflexões sobre temas importantes à luta da categoria docente. “Além disso, contribuem para o debate sobre as questões específicas das seções sindicais nos territórios, fortalecendo a organização política e sindical, em diálogo com as pautas e resoluções aprovadas no 43° Congresso”, disse.

A docente ainda destacou a vitória recente na UFF, quando em março deste ano, o Conselho Universitário da instituição retirou o título de Doutor Honoris Causa concedido pela UFF, em 1972, a Jarbas Passarinho (Ministro da Educação da Ditadura durante o AI-5).  A mobilização contou com a participação direta da Aduff e do Grupo Tortura Nunca Mais/RJ e também envolveu as entidades representativas dos(as) técnicos-administrativos (Sintuff) e de estudantes (DCE-UFF Fernando Santa Cruz).

A construção política pela retirada do título tem mais de uma década e teve início em 2013, a partir dos trabalhos do projeto Memórias da Ditadura na UFF, do Grupo de Trabalho de História do Movimento Docente (GTHMD) da entidade. “Foi um passo muito importante para a nossa universidade”, reiterou.

“População do campo é submetida a um silenciamento desqualificador e vista a partir de um lugar de atraso”

A professora Leonilde Medeiros (UFRRJ) também participou da mesa e apresentou o debate sobre a luta por memória, justiça e reparação no campo, contando a história da organização e da criação da Comissão Camponesa da Verdade, em movimento impulsionado pelos movimentos sociais, com a participação de um grupo de acadêmicos e pesquisadores do tema.

A docente destacou o enorme interesse institucional à época sobre a Guerrilha do Araguaia e defendeu que os conflitos no campo, durante a ditadura, vão muito além da violência sofrida por grupos de esquerda, organizados nas regiões rurais.

Para a professora, a dificuldade de recuperar esses relatos, em diferentes momentos da história brasileira, está diretamente ligada ao fato de que a população do campo é submetida a um silenciamento desqualificador e vista a partir de um lugar de atraso. “É uma população inominada, sem registro, sem sobrenome, ‘que não precisa ser identificada’. Então a gente trabalha muito com a memória oral”, disse.

Ela enfatizou que a principal luta dessas populações era pela permanência terra, entregue pela ditadura a grandes empresas privadas, como se estivessem desocupadas. A docente ainda reivindicou a responsabilização empresarial sob esse processo de violência.

“Nos anos 1970, o lugar onde mais havia conflito no Rio de Janeiro foi o entorno da Rodovia Rio-Santos. É como se aquilo lá fosse um terreno vazio, mas era uma terra ocupada por populações caiçaras, negras, que resistiram da forma como podiam a um processo que tem a ver basicamente com a atuação de um turismo de negócios e com a ideia dos militares de pegar aquela região de Angra e Paraty e transformar num modelo de ocupação tipo Riviera Francesa. É só passar por ali para ver o número de resorts. As populações inteiras foram expropriadas, com níveis diferentes de violência”, exemplificou.

De acordo com a docente, o campesinato resistiu o tempo inteiro ao longo da ditadura. Ela citou o levantamento realizado por Gilney Viana, que registra 1.196 casos identificados de mortos e desaparecidos no campo brasileiro, entre 1961 e 1981. “Isso sem contar os casos sem nome ou sobrenome, casos de desaparecimento que as pessoas nos contam, mas que os detalhes se perderam. É muito difícil de chegar a essas famílias e a essas pessoas, mas a gente chega nas situações de violência, através do registro das memórias. Aqui na Baixada, na Região de Caxias, Nova Iguaçu, nos contaram que quando as tropas desceram de Juiz de Fora, algumas já ficaram nessas regiões e iam de casa em casa tirar coisas do armário, futucando colchão com baioneta atrás de armas. É um pouco a ideia de que as lutas camponeas eram focos de guerrilhas, que estavam todos armados”, reforçou.

Além do silenciamento, a docente também reiterou a permanência da violência do campo em momentos mais ou menos democráticos.

“Neste ano, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) já publicou seu boletim anual e os dados mostram que o nível de violência no campo aumenta. Se a gente pega a série da CTP, que publica o boletim desde 1985, o que a gente tem são períodos de maior ou menor violência, mas a gente não tem momentos de não existência dessa violência, de morte, de expropriação, de expulsão de camponeses. Em momentos mais ou menos democráticos, a violência segue acontecendo”, enfatizou.

Presente na atividade, a professora da Faculdade de Educação das UFF, Gelta Xavier, avaliou a importância de manter acesa a chama da luta por justiça. A docente que integra o Conselho de Representantes da Aduff parabenizou a fala de Leonilde Medeiros, que em sua apresentação destacou “os elos entre a história da luta pela terra e os processos por reparação”.

“A questão fundiária revela-se tema presente porque associado a direitos, basicamente ao trabalho. Memória, história, verdade, justiça são termos que se associam a exigência de condições de vida, igualmente tratados nas manifestações do 1° de Maio. São as nossas origens, como filhos, netos, bisnetos de imigrantes e remetem a nosso destino, pretendendo a inserção social, pela via do trabalho dos mais jovens. As ações políticas, realçadas nas pautas dos sindicatos, implicam intensificar os debates, atualizando e aproximando as campanhas pela Vida Além do Trabalho (VAT), meio-ambiente e as relações entre cidade e campo”, finalizou Gelta.

Da Redação da Aduff | por Lara Abib, com informações de Adunirio

 

 

Regional RJ do Andes-SN reúne docentes para discutir luta por Memória, Justiça e Reparação / Bruno Marinoni | Adunirio

Additional Info

  • compartilhar: