“Tem dinheiro pra tudo, mas nunca tem para saúde e educação”. A frase dita por um servidor ecoou entre uma série de outras no auditório da UFRJ quando a ministra da Gestão e Inovação nos Serviços Públicos, Esther Dweck, subiu ao palco para iniciar a aula magna. A ministra ouviu então, por alguns minutos, as contestações e reclamações, algumas bem duras, levadas ao evento no Centro de Ciências da Saúde (CCS), no Fundão, na manhã e início da tarde da segunda-feira (14).
A Aduff-SSind estava lá e ajudou a convocar o protesto, que começou nas escadarias do Centro de Ciências da Saúde da UFRJ, no Fundão, e depois se estendeu ao plenário do auditório Professor Rodolpho Paulo Rocco, o popular ‘Quinhentão', apelido que remete à sua capacidade de público.
As reivindicações centrais foram o cumprimento de todos os pontos dos acordos firmados no ano passado com o governo federal e o arquivamento da ‘reforma’ administrativa.
Faixas foram estendidas e cartazes expostos, com a manifestação ‘ocupando’, sem inviabilizar, o evento da Reitoria. Antes de iniciar a palestra, Esther Dweck tentou explicar, de modo geral, a situação dos acordos firmados.
Lamentou o atraso no cumprimento do reajuste salarial, creditando o problema ao impasse de votação da Lei Orçamentária pelo Congresso Nacional. Argumentou que a maioria dos outros pontos estão num ritmo que considera razoável, apesar de quatro meses terem se passado desde o início do ano em que as mudanças deveriam começar a ser implementadas.
Em apenas um ponto admitiu estar muito atrasado: o decreto liberando de controle de ponto docentes da carreira EBTT, estacionado na mesa do ministro Rui Costa, da Casa Civil. Sobre a equiparação do auxílio-alimentação entre os três poderes, disse que já poderia adiantar que os estudos de impacto demonstram que ela por enquanto é inviável, mas afirmou haver espaço para reduzir mais a diferença atual.
Cobranças, EBTT e auxílio-transporte
Ainda antes do início da cerimônia, a ministra conversou com alguns representantes sindicais na entrada do auditório, entre eles o professor Raul Nunes, secretário-geral da Aduff, e a professora Gelta Xavier, ex-presidente da seção sindical. “Não se esqueça que você é uma servidora. Orgulhe o nome da sua mãe, ela esteve conosco em todas as assembleias na greve na UFF”, recomendou Gelta à ministra e professora da UFRJ, poucos segundos antes da própria mãe da ministra, a professora Ruth Dweck, chegar ao local, abraçar a colega e provocar risos, num breve momento de descontração.
Na conversa apressada antes da aula magna, a ministra foi cobrada sobre alguns pontos dos acordos e questionada sobre a crise no financiamento das universidades - a poucos metros dali, caixas de isopor e baldes recolhiam a água gerada pelas infiltrações no teto do próprio CCS.
Ao ser indagado pela ministra sobre qual ponto do acordo estaria sendo descumprido, o diretor da Aduff mencionou a regulamentação da carreira EBTT. “Vai sair, só não posso dar um prazo”, disse a ministra, após concordar que o ponto ainda não foi cumprido. O secretário-geral da Aduff também mencionou a temeridade da instrução normativa referente ao auxílio-transporte, que em parte das instituições de ensino está sendo usada como forma de controle de frequência dos docentes (IN SRT/MGI nº 71 de 19/02/2025).
“O problema aí é que teve uma interpretação errada de algumas reitorias”, respondeu a ministra, prometendo agir para dirimir o engano. “Ela disse que a interpretação é equivocada, mas não deu direcionamento de revogação nem de uma nova instrução. É importante que a gente mantenha atenção em relação a isso”, analisou, pouco depois, Raul Nunes. Quando questionada pelo diretor sobre a "reforma administrativa por baixo dos panos" trazida na MP do reajuste, a ministra discordou com indignação e disse que trataria do tema na aula magna, o que não ocorreu.
Mais tarde, ao final do evento, numa breve e mini coletiva com jornalistas que se encontravam no local, a ministra voltou a responder à reportagem da Aduff-SSind sobre o assunto, reiterando que o auxílio-transporte não é para ser usado para controle de ponto. Observou que algumas reitorias estão aplicando algo que era direcionado a quem está em teletrabalho e que a exigência do detalhamento dos dias de deslocamento não deve ser exigida de docentes. Disse que a questão seria tratada pelo ministério, porém não detalhou como isso seria encaminhado.
Carta
Ao final da Aula Magna, uma comissão de servidores, representando as entidades sindicais, entregou uma carta à ministra, que não só reforça a defesa do respeito aos acordos, como critica a política econômica adotada pelo governo e seus reflexos nas pautas sociais e nos serviços públicos.
“Aprovada a LOA, continuaremos com orçamento público federal insuficiente e os convênios nos estados e municípios para o bom funcionamento de hospitais, escolas, universidades, para moradias estudantis, dentre outros, continuarão limitados”, diz trecho do documento.
A carta também menciona a rotina de atrasos no pagamento das contas, nos salários de trabalhadores e trabalhadoras terceirizadas e os desmoronamentos de prédios públicos por falta de manutenção. “Certamente uma vergonha para a 10° economia mundial", assinala o texto. A carta também associa o não cumprimento integral dos acordos de greve a uma opção política do governo: “amarrado pela própria defesa do Novo Arcabouço Fiscal”, política que afeta as áreas sociais, mas não o lucro dos bancos.
Importância do ato
“O protesto foi importante para marcar a atuação dos servidores públicos federais no Rio de Janeiro. E conseguiu ter respostas e um diálogo mais direto com a ministra, que na mesa de negociação muitas vezes põe prepostos para negociar”, avaliou, logo após o protesto, o servidor Raul Nunes.
“Cobramos o cumprimento dos termos acordados na greve do ano passado. A ministra disse que em parte está sendo cumprido e focou bastante no reajuste. Mas a gente lembrou a ministra que o reajuste salarial não é o único ponto e mesmo nesse ponto há demoras: por exemplo, nos institutos federais pode ser que eles não tenham o reajuste agora em maio” disse.
O servidor criticou ainda o fato da ministra ter sido reticente em outros pontos. “Em relação à carreira docente ela falou que a regulamentação do trabalho da carreira EBTT vai sair, mas não quis dar um prazo”, observou. Em relação à reforma administrativa, diz, a ministra abordou superficialmente e não falou, por exemplo, sobre o que consta nesta área na medida provisória e no projeto de lei enviados pelo governo ao Congresso, tampouco se as medidas atingirão os docentes. “Pontos que são considerados pelos sindicatos parte de uma reforma administrativa infraconstitucional”, assinala Raul.
Da Redação da Aduff
Por Hélcio Lourenço Filho
O diretor da Aduff Raul Nunes fala com a ministra Esther Dweck