Fev
20
2025

Aduff defende retirada do título de Doutor Honoris Causa concedido pela UFF a Jarbas Passarinho

Processo está na pauta da reunião da Câmara Especializada de Legislação e Normas da Universidade de 24 de fevereiro. De lá, segue para deliberação do Conselho Universitário (CUV), em reunião prevista para 12 de março. Em atividade unificada dos três segmentos, docentes, técnicos-administrativos e estudantes irão acompanhar a sessão do CUV, retransmitida ao vivo na sede da Aduff, com a participação de conselheiros e conselheiras dos três setores.

 

Como parte das reflexões sobre os mais de 60 anos do golpe empresarial-militar no Brasil, na luta por memória, verdade, justiça e reparação, a Associação de Docentes da UFF (Aduff-SSind), seção sindical do Andes-Sindicato Nacional, e o Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro (GTNM-RJ) defendem a retirada do título de Doutor Honoris Causa concedido pela Universidade Federal Fluminense (UFF) a Jarbas Gonçalves Passarinho.

Ministro da Educação (1969 a 1974) no período do AI-5, momento de grande terror do Estado, durante a ditadura empresarial-militar brasileira, Passarinho é alçado à política profissional com o golpe de 1964, primeiro como interventor do Estado do Pará, depois como senador pela Arena, antes de ser nomeado ministro do Trabalho, durante o governo Costa e Silva, na tentativa de conter o movimento dos trabalhadores, duramente reprimidos desde os primeiros dias do golpe.

Seu período no ministério da Educação, durante o governo do ditador Emílio Garrastazu Médici, ficou marcado pela formulação e capilarização nas universidades dos órgãos de espionagem da ditadura, por uma gestão que irá manusear diretamente o decreto 477 (de fevereiro de 1969), conhecido como o AI-5 das Universidades, e pela intensificação do processo de implementação da Reforma Universitária.

A concessão do título Doutor Honoris Causa ocorreu através da resolução 25/72 do Conselho Universitário da UFF, em 25 de julho de 1972, e tinha como anexo uma mensagem escrita e assinada pelo então reitor, Jorge Emmanuel Ferreira Barbosa, em que exaltava os “feitos” do coronel. 

“Esses episódios de concessão de títulos acadêmicos a membro dos círculos dominantes de poder (como coronéis, generais, empresários etc) ocorreram em outras universidades do país, e geralmente eram estabelecidos como um ritual propagandístico de exaltação das políticas implementadas durante a ditadura, além de ser a expressão clara do uso da universidade como instrumento de obtenção de prestígio e barganha de poder”, destaca o documento assinado pelas duas entidades, Aduff-SSind e o Grupo Tortura Nunca Mais/RJ, ao recomendarem à Universidade a retirada do título concedido a Jarbas Passarinho.

A recomendação foi submetida à reunião do Conselho Universitário (CUV) da UFF, encampada por conselheiros docentes, e deu origem a um projeto de resolução, encaminhado à Câmara de Legislação e Normas da Universidade, que deve emitir um parecer sobre o assunto em sua próxima reunião, no dia 24 de fevereiro. De lá, o projeto de resolução segue para deliberação do Conselho Universitário, com previsão de entrar em pauta na reunião do CUV do dia 12 de março (quarta-feira). 

Caso a data se confirme, docentes, técnicos-administrativos e estudantes da Universidade, por meio de suas entidades representativas, Aduff, Sintuff e DCE-UFF, realizarão, no dia 12 de março, uma atividade unificada de acompanhamento ao vivo da sessão do Conselho, que será retransmitida da sede da Aduff, com a participação de conselheiros e conselheiras dos três setores. 

‘Contrapelo aos silenciamentos e esquecimentos”

Integrante da diretoria da Aduff e da diretoria colegiada do Grupo Tortura Nunca Mais/RJ, Joana D'Arc Fernandes Ferraz pontua que a construção política pela retirada do título concedido pela UFF a Jarbas Passarinho já tem mais de uma década e teve início em 2013, a partir dos trabalhos do projeto “Memórias da Ditadura na UFF”, do Grupo de Trabalho de História do Movimento Docente (GTHMD) da Aduff, em pesquisa realizada por Rafael Vieira (atualmente professor da UFRJ), com a coordenação de Wanderson Melo, professor da UFF de Rio das Ostras, que integrou as diretorias da Aduff de 2012 a 2016.

“Eles fizeram um trabalho muito interessante que deu origem ao livro “Atitudes de Rebeldia: as formas da universidade tecnocrática, o aparato vigilante/repressivo e as resistências dos professores da UFF durante a ditadura”. Nesse livro, recomendam uma série de coisas e informam sobre o título dado a Jarbas Passarinho. Com base nesses documentos e nos arquivos do Grupo Tortura Nunca Mais/RJ, estamos levando adiante essa reivindicação, caminhando no sentido de afirmar outras memórias, em contrapelo aos silenciamentos e esquecimentos”, reforça a docente do Departamento de Sociologia e Metodologia em Ciências Sociais, da UFF Niterói.

Joana D'Arc ainda destaca que diversas Universidades brasileiras também já estão atuando a fim de retirar de sua memória a marca que exalta o terror do Estado no período da ditadura empresarial-militar. Em 2021, por exemplo, os Conselhos Universitários da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) aprovaram a revogação do mesmo título de Doutor Honoris Causa concedido a Jarbas Passarinho. Em 2024, foi a vez da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) cassar os títulos dado a Passarinho e a Emilio Garrastazu Médici.

A continuidade das ações de “desomenagens” a figuras apoiadoras da ditadura, nas instituições de ensino, também é uma das resoluções do 43° Congresso do Andes-SN, principal instância de deliberação do movimento docente, realizado no final de fevereiro, em Vitória (ES). Na luta por memória, verdade, justiça, reparação e contra a anistia para golpistas, o Sindicato Nacional aprovou assumir como tema prioritário, para o ano de 2025, o debate sobre Anistia e Impunidade, tanto relativos à ditadura quanto aos intentos golpistas recentes. 

Também foi deliberado pelo 43° Congresso cobrar do governo federal o fortalecimento e a garantia de condições de trabalho para a Comissão de Mortos e Desaparecidos, além da reivindicação de um lugar de memória que acolha as diferentes vozes de resistência à ditadura. “Não está no documento que enviamos, mas para mim é central que haja sim um local de memória na UFF, com totem ou placa, informando o nome de professores, técnicos e estudantes, atingidos pela ditadura na UFF. Um local onde essa memória seja, de fato, relembrada”, reforça Joana D’arc. 

Ela destaca que além da retirada do título de Doutor Honoris Causa a Jarbas Passarinho, a Aduff e o Grupo Tortura Nunca Mais também solicitam atenção sobre dois pontos que compõem a política de reparação às violações de direitos ocorridas na UFF, durante a ditadura. “É fundamental que se faça uma força-tarefa no interior dos órgãos da UFF a fim de que se amplie o acervo documental da ASI/UFF. A documentação desse período na universidade está toda dispersa. É necessário que a UFF encaminhe uma ação mais séria em relação à organização desses arquivos na instituição, procedimento que também é sugerido em relação aos arquivos da DSI/MEC, no âmbito do governo Federal. E por fim, a reintegração simbólica à UFF de servidores e alunos que foram presos, afastados e desaparecidos pela ditadura empresarial-militar brasileira, com a diplomação de estudantes que não se formaram. Alguns deles, inclusive, foram homenageados pelo Grupo Tortura Nunca Mais/RJ com a Medalha Chico Mendes de Resistência. O que a gente reivindica é que as políticas de reparação também partam da Universidade”, finaliza.

Da Redação da Aduff
Por Lara Abib

 

 

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