Set
12
2016

Ebserh ganha diretor da Odebrecht e perfil ‘mercado’ fica mais gritante

Crise da saúde é debatida no Huap no momento em que nome da empreiteira é nomeado diretor da empresa que controla a maioria dos hospitais universitários

Da Redação da Aduff-SSind
Foto: Luiz Fernando Nabuco - O professor e médico Wladimir Soares fala durante o debate sobre a crise na saúde e a Ebserh realizado no Huap
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“O modelo de gestão que se aprofunda é o da precarização dos serviços públicos”, resumiu Keila Camelo, ao fazer um balanço dos quase três anos de cessão do Hospital Universitário Walter Cantídio, da Universidade Federal do Ceará, à Ebserh, em debate no auditório da Faculdade de Medicina da UFF, promovido pelo sindicato dos técnicos-administrativos da UFF (Sintuff) no dia 25 de agosto. Com o tema “Ebserh: a crise da saúde e a precarização das condições de trabalho”, as discussões contaram ainda com as considerações de Wilson Prudente, procurador federal; e de Wladimir Soares, que é advogado, médico do SUS, professor do Departamento de Medicina Clínica da Faculdade de Medicina da UFF e ex-dirigente da Aduff-SSind. A professora Elza Dely Macedo esteve presente, representando a direção do Andes-RJ e da seção sindical dos docentes da UFF.
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Os palestrantes enfatizaram que a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares  (Ebserh), criada pelo governo federal por meio da Lei 12.550/2011, visa promover a mercantilização da saúde ao transferir recursos que poderiam ser investidos no setor público para as empresas privadas, permitindo o sucateamento das unidades de atendimento. Revelaram ainda que, apesar das promessas de melhorias aos hospitais-escolas que firmaram contrato com a Ebserh – a exemplo do que tem acontecido em estados como Ceará, Brasília, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Pernambuco, Bahia, Rio Grande do Sul e Maranhão – não foram verificados ganhos acadêmicos, sociais ou ainda gerenciais. O que se vê é a queda da qualidade no atendimento, agravada pelo fechamento de leitos, pela redução no número de atendimentos e na realização de exames, e pelas práticas recorrentes de assédio moral e pela instituição de plano de metas irreais.
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Keila Camelo, coordenadora-geral do sindicato dos técnicos na UFCE (Sintufce), mencionou dados reunidos em dossiê com mais de cem páginas, entregue à Reitoria da instituição, que revelam as péssimas condições – seja em relação à infraestrutura, com banheiros entupidos, lâmpadas queimadas, parte elétrica exposta; seja em relação ao atendimento.  Fechamento de unidades, redução na realização de exames, como tomografias e ressonâncias, falta de insumos médico-hospitalares e cancelamento de cirurgias são outros problemas citados no relatório e que depõem contra o modelo de gestão da Ebserh. A dirigente sindical também explicou que a comunidade se mobilizou em abaixo-assinado, entregue à administração central da universidade, protestando contra a cessão de servidores RJU, portanto concursados, para atuarem de forma subordinada à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares.
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O procurador federal criticou a terceirização da gestão dos hospitais públicos pela Ebserh e disse que a cessão do Hospital Universitário Antonio Pedro (Huap) a essa empresa deveria ser levada, por meio de denúncia, ao Tribunal Internacional de Direitos Humanos.
Ele afirmou que os hospitais federais viraram fonte de transferência de recursos da União, sobretudo por meio da criação de organizações sociais, para beneficiar exclusivamente aqueles que objetivam lucrar com a Saúde. “Isso foi feito, num primeiro momento, a partir do discurso de que a administração pública é custosa”, explicou Wilson Prudente, lembrando que, por trás desse argumento, estão interesses mercadológicos que atendem ao setor privado em detrimento das necessidades da população.
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Tanto é assim que, nos últimos dias, o presidente interino Michel Temer nomeou Jaime Gregório dos Santos Filho, representante de empreiteiras envolvidas no esquema de corrupção denunciado pela ‘Operação Lava Jato’, como diretor da Ebserh. A nomeação de Jaime Gregório, que assinou como representante do consórcio formado pela Odebrecht, OAS e Queiroz Galvão para as obras do BRT no Rio de Janeiro, foi publicada no Diário Oficial da União do último dia 8 de agosto, evidenciando as estreitas relações entre interesses públicos e privados pela alta cúpula do governo federal.
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Ovo da serpente: privatização
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“O Brasil é surreal”, disse o docente Wladimir Tadeu, criticando a falta de investimentos em saúde pública e revelando um dado alarmante: nos últimos anos, cerca de 25 mil leitos foram fechados no país, sendo a metade no Rio de Janeiro. “Somos a sétima economia mundial, apesar da crise fiscal e da roubalheira. Não nos reconhecemos como uma potência econômica. Investimos apenas 4% do Produto Interno Público em Saúde – menos do que Argentina, Chile, Paraguai e Bolívia, por exemplo. Nos países filados à Organização das Nações Unidas esse percentual é de 10%”, contou. “Desses 4%, mais de 50% são destinados para a iniciativa privada”, complementou, para dizer que a criação da Ebserh está direcionada a uma dada concepção do que deve ser o papel do Estado em relação ao gerenciamento das políticas sociais, entre elas Educação e Saúde.
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O professor relacionou a criação da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares às diretrizes privatistas que já se consolidavam no país ainda nos anos 1990. Esclareceu que, em meados daquela década, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, o Banco Mundial sistematizou um documento que indicava alguns parâmetros a serem adotados pelo Brasil para conduzir a gestão da saúde pública. Esse modelo, embebido pela política neoliberal, já abria as portas para a flexibilização das relações de trabalho por meio da terceirização e para a redução de investimentos em serviços públicos, estimulando, inclusive, o fortalecimento do ‘terceiro setor’ (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público ou Oscip; Organizações Não Governamentais – ONG; Organizações Sociais – OS e afins).
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Segundo Wladimir, desde a sua criação, a Ebserh tem finalidade lucrativa, explicitada logo nos primeiros artigos legais que afirmam que a sua finalidade é a exploração de atividade econômica. Além disso, fere a autonomia universitária e atenta contra conquistas democráticas dos trabalhadores ao proibir a eleição de seus gestores.
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Ebserh poderá entrar no programa de privatização de Temer, diz jornal
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A estatal de direito privado que nasceu no final do governo Lula sob denúncias de que levaria à privatização da gestão dos hospitais públicos universitários poderá ser incluída no programa de prizatizações do contestado governo interino de Michel Temer.
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A notícia, ainda sem confirmações oficiais, foi divulgada pelo colunista do jornal “Estado de São Paulo” João Domingos. A criação da empresa em si, porém, já foi denunciada como um projeto privatista e pronto para a abertura de capitais.
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A Aduff-SSind defende a revogação do contrato do Huap com a Ebserh, tanto pelo seu caráter antisserviço público quanto por ter sido aprovado de forma irregular. (Por Hélcio Lourenço Filho)
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Da Redação da Aduff-SSind
Por Aline Pereira e Hélcio Lourenço Filho. Publicado originalmente na edição da primeira quinzena de setembro de 2016 do jornal da Aduff-SSind.